Jorge Fiel
Com 52 anos de idade, António Pereira, conta como tomou a mais importante decisão da sua vida profissional, recolhido na praia da Amorosa, em Viana do Castelo, onde vive.
oi na Primavera de 2015, tinha ele 50 anos exactos, que foi chamado a tomar a decisão mais difícil da sua vida. Os alemães da K4, que tinham acabado de comprar a divisão têxtil da sua compatriota Daun, chamaram-no a Munique para lhe comunicar que iam fechar a Fitor e concentrar o fabrico de fios sintéticos na Alemanha, na fiação TWD. Mas, acrescentaram, o futuro dele não estava em risco, pois estava convidado a ficar como responsável de vendas para o sul da Europa. António Pereira não estava nada à espera daquilo – e pediu-lhes uma semana para pensar.
“No regresso, até me senti mal no avião”, confessa. Recolheu para a praia da Amorosa, Viana do Castelo, onde vive há uma dúzia de anos, e foi ali à beira-mar, no mesmo sítio onde escolheu almoçarmos um belo arroz de robalo na Tasca do Gomes, que tomou a grande decisão. Não podia aceitar o fecho da fábrica que conseguira salvar do naufrágio à custa de tantas canseiras e noites mal dormidas.
“Quando entrei na Fitor, em Setembro de 2008, toda a gente dizia que eu não chegava ao Natal. Não havia dinheiro. Tive de improvisar. Pedir aos clientes pagamentos antecipados. Implorar aos fornecedores que nos adiantassem matéria-prima. Mais tarde, quando já estávamos com a cabeça fora de água, levamos em cima com a crise de 2011/12, que não foi só cá com o resgate e a troika, mas afectou toda a têxtil europeia, onde estão os nossos clientes. Foi muito duro”, recorda.
Também foi muito complexo e doloroso liderar um violento downsizing da Fitor (de um pico de 280 trabalhadores tinha minguado para 20), que os alemães foram progressivamente transformando numa mera unidade comercial, enquanto a iam esvaziando da componente industrial, transferida para a alemã TWD.
“Do ponto de vista financeiro fazia sentido, porque a energia era mais barata lá e havia ganhos na concentração da produção, daí a minha dificuldade em criar obstáculos à deslocalização”, explica António, que recusou desempenhar o papel de carrasco da Fitor e contrapropôs aos alemães fazer um MBO. Foi a vez deles ficarem surpreendidos.
“Não estavam nada à espera, mas acabaram por aceitar. Durante o Verão negociámos um contrato em termos bastante razoáveis”, reconhece o António, que tinha no bolso um plano quase tão simples como o do Marquês do Pombal (cuidar dos vivos e enterrar os mortos) após o grande terramoto de 1755.
O plano consistia em recuperar os clientes perdidos, pôr a produção a funcionar, reactivar a tinturaria, comprar novas máquinas, investir em inovação (“a têxtil é metade engenharia e metade design e criatividade”) e subir na escala de valor (“saímos das commodities, do fio cru”).
Dois milhões de euros investidos e 18 meses volvidos, os números garantem que a coisa está a resultar: o efectivo cresceu de 20 para 75 trabalhadores e a facturação dos cinco milhões (2015), para sete milhões (2016) – 70% dos quais em exportação directa. Este ano, o objectivo é chegar aos oito milhões de euros.
“Estamos a conseguir recuperar os clientes mais depressa do que estávamos à espera – e a um ritmo superior ao da nossa capacidade instalada. As máquinas novas que estamos a comprar são mais eficientes, produzem mais com menos custos e são para acrescentar às que temos – não para as substituir”, conta o engenheiro informático reconvertido em gestor e empresário que salvou a Fitor.
Filho de um motorista do STCP, cresceu no Porto - morava na rua da Boavista, fez a primária em Cedofeita e o Secundário no Rodrigues de Freitas. Na adolescência desdobrou-se em biscates diversos, como a colaboração em jornais (Voz Portucalense, Notícias da Tarde e JN) ou a venda de enciclopédias. Apaixonado por computadores, por influência de séries como o Star Trek e Espaço 1999, escolheu fazer Engenharia de Sistemas, na UMinho. Foi bom aluno (no 3º ano já era monitor) mas não ficou fã da informática que lhe abriu a porta dos dois primeiros empregos - na Pinto Azevedo & Rangel e depois da PwC. Filado em emigrar para a gestão, fez um MBA na AEP/ESAD e um mestrado em Finanças na UM. No ano 2000 desembarcou na têxtil. Demorou-se quatro anos na Holanda como director de operações da Lankhorst (cordas e redes de pesca). No caminho que o levou até à Fitor, em 2008, fez escalas na Tebe, TMG e Organtex China (viveu entre Xangai e Hong Kong). Ao fim-de-semana gosta de correr e jogar ténis.