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João Peres Guimarães tinha outros planos, mas a Revolução dos Cravos e o Verão Quente de 75 acabaram por o encaminhar para uma carreira na indústria têxtil. Uma obrigação que se tornou devoção e o empresário é agora o representante português na Euratex.
inha tudo planeado. Mal acabasse o curso, mudava-se para Luanda, onde além de se ocupar de negócios têxteis da família (Angola era o principal mercado) faria a tropa, tal como o avô materno José Fernandes Peres, um sargento mobilizado para Moçambique durante as duas Guerras Mundiais.
Só que entretanto aconteceu a Revolução dos Cravos, que virou de pernas para o ar as vidas de toda a gente, incluindo a dele, que no final do Verão Quente de 75, com o curso acabadinho de fazer, foi chamado, tipo pronto socorro, para tomar conta da mais recente fábrica do pai, a Motextil, que fazia tecido para camisas (o primeiro tear foi batizado 25 de abril pois foi montado na Maia no preciso dia em que a coluna de Salgueiro Maia tomou Lisboa).
“Não percebia nada de têxtil. E a fábrica não tinha dinheiro nem mercado. Só um endividamento galopante, devido à constante desvalorização do escudo, pois tinha sido financiada em francos suíços”, resume João Peres Guimarães, que assim aprendeu que era melhor não fazer planos para a vida – para não atrapalhar os planos que a vida e o pai tinham para ele.
No início dos anos 80, quando a Motextil já tinha a cabeça bem fora de água, apanhou outro murro no estômago: a crise que motivou a intervenção do FMI e levou este engenheiro, que a circunstâncias transformaram em industrial têxtil (“um erro de casting”, comenta, meio a sério), a perceber que o destino é algo que se deve ver olhando para trás – e não para se saber de antemão.
A seguir, quando vieram os tempos das vacas gordas, já João Peres Guimarães estava resignado a cumprir o seu destino e activamente enfarinhado na preparação de um presente e futuro melhores para a industria que o escolheu – basta dar uma vista de olhos pelo seu curriculum (onde constam passagens pelas direções da ANITAF, APT e ATP, e a sua atual participação na ERSE e Euratex, em representação da ATP) para fazer a prova dos nove desse empenhamento.
“Estrategicamente, devíamos investir forte no fabrico de fibras artificiais de grande qualidade e valor. É uma necessidade urgente”, sintetiza João Peres Guimarães, que escolheu almoçarmos no Líder (um restaurante localizado num lugar onde outrora havia os campos em que brincava em miúdo) numa excepção à excepção à regra de almoçar quase todos os dias em casa com a família.
O investimento no fabrico de fibras artificiais permitiria fechar a verticalização do ciclo produtivo na nossa ITV, da matéria prima ao produto acabado, e assim atenuar a debilidade decorrente de não produzirmos algodão.
Além de corrigir uma fragilidade estrutural da ITV, a produção de fibras artificiais (“Como é um investimento pesado, devia contar com o apoio do Estado e dos fundos estruturais”) possibilitaria um reordenamento do território (a matéria prima é pasta de celulose) bem como o desenvolvimento das competências que já temos em áreas como silvicultura, química, física e ambiental.
“Um quilo de algodão implica um gasto de dez mil litros de água. Ora a água é o recurso que vai faltar dentro de uma dúzia de anos. Num futuro próximo, a escassez de água vai obrigar a que ela seja usada fundamentalmente no que é essencial, que é alimentação”, explica este engenheiro que está na têxtil por obrigação mas também por devoção .
Cresceu no Porto, na rua da Alegria, criado pelos avós maternos que moravam junto ao estádio do Lima, onde assistiu a jogos de andebol de 11 e hóquei em campo - mas também corridas de ciclismo e combates de boxe. Após a primária, feita no Pilha Galinhas (o severo Externato Vieira de Castro), completou o liceu entre o Alexandre Herculano e o João de Deus. Como a Física era uma paixão impossível, licenciou-se em Engenharia Eletrotécnica na FEUP, onde viria a fazer uma pós graduação em Ambiente. Portista desde o berço (foi batizado no dia da inauguração do Estádio das Antas) recebeu a roseta de 50 anos de sócio no mesmo dia que Pinto da Costa. É casado, tem uma filha (Carolina), e a Matemática é a sua mais recente paixão (“parecia um quebra cabeças e afinal é tão fácil!”)
Pratos: Filetes de polvo com arroz do mesmo; polvo à lagareiro Sobremesa: Abacaxi Bebidas: Vallegre branco, água e cafés