UMA UTOPIA POR REALIZAR
T34 Julho & Agosto 18

Paulo Vaz

Diretor Geral da ATP e Editor do T
E

m 1 de julho de 2003, a “APT –Associação Portuguesa de Têxteis e Vestuário” e a “APIM – Associação Portuguesa das Indústrias de Malha e Confecção”, as duas maiores organizações representativas do sector têxtil e vestuário português, realizaram uma fusão de estruturas dando assim lugar à “ATP – Associação Têxtil e Vestuário de Portugal”, tendo como objetivo criar uma voz mais forte, mais audível, mais coerente e consistente, capaz de uma representação mais eficiente e eficaz da fileira junto do Poder, em Lisboa e Bruxelas.

Para os que possuem memória curta ou seletiva, recorda-se que a ITV portuguesa vivia momentos difíceis então, confrontada com um conjunto de choques competitivos avassaladores – liberalização do comércio têxtil internacional, entrada da China na OMC  (Organização Mundial do Comércio), adopção do euro como moeda e alargamento da União Europeia ao leste do continente – que a projetaram num declínio acelerado e que parecia irreversível e fatal.

A fusão das duas organizações, que, através da ATP passaram a representar a maioria da indústria têxtil e vestuário portuguesa foi um vigoroso sinal dado ao Poder e à sociedade em geral  de que o sector se dispunha a “vender caro a pele”, que “não ia entregar os pontos” e que tudo faria para resistir a um destino, que as circunstâncias e alguns decisores políticos, no exterior e no país, lhe vaticinavam como fatal. Mas, mais importante do que isso, foi um sinal para dentro de sector que testemunhava existir uma organização disposta a lutar pelos seus interesses e anseios, com argumentos e recursos, sobretudo liderança assertiva, fosse em Lisboa, em Bruxelas, Washington ou Pequim.

Se não tivesse existido, nesse momento, uma ATP com sentido de missão e orientação estratégica, que possibilitou, em conjunto com a ITKIB (Turquia) e a NTCO (USA), a criação da GAFTT – Global Alliance for Fair Textile Trade, que se apresentou, através da “Declaração de Istambul”, como uma verdadeira barreira à hegemónica apropriação do negócio têxtil global pela China, possivelmente muitas das empresas que ainda compõem o sector em Portugal não existiriam, nem tão-pouco teria sido criada a oportunidade para se realizar, com mais tempo e preparação, a reestruturação de toda a indústria e a sua reinvenção para uma competição assente na diferenciação pelo valor e não pelo preço.

Hoje, quando já tudo parece distante, quando os ventos parecem soprar mais de feição, há mais quem se posicione, esquecendo convenientemente este histórico, a defender a divisão em vez da união, não se descortinando quais os argumentos de tal opção, os quais certamente não podem invocar o interesse do sector, dos subsectores que o compõem e das empresas que neles se integram.

Uma só voz, uma só liderança, um só interlocutor e uma só estratégia, confeririam à Indústria Têxtil e Vestuário portuguesa uma importância ainda maior, mais visibilidade, respeito e reconhecimento acrescidos. Ninguém parece duvidar disso, lamentando-se apenas a acomodação do sector, que espera que os outros façam aquilo que ele reclama em particular, mas sem oferecer o trabalho e a responsabilidade dessa implicação, que tem de impor publicamente.

Perante tudo isto, mesmo quando os ventos da história nos confundem, temos presente que as utopias pelas quais lutamos, apesar de não estarem realizadas, permanecem objetivos colectivos a realizar, pelo que devemos apelar à persistência e ancorar-nos na tenacidade da razão que nos assiste para não desistirmos desse desígnio. Nesta data, como há quinze anos atrás, ou daqui a quinze se o destino assim ainda o quiser.

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