O consumidor e o negócio da moda
T46 Setembro 19

Paulo Vaz

Diretor Geral da ATP e Editor do T
O

negócio da moda é o maior à escala global. Gera mais de 3 triliões de dólares e garante mais de 75 milhões de empregos. Possivelmente estes números pecam por defeito, mas já de si impressionam. Além disso é a única atividade económica que praticamente cresceu sempre, desde que há registos históricos, com exceção do ano de 2009, no rescaldo da crise económica e financeira global, que teve impactos diretos e dramáticos no consumo planetário de produtos de moda, mas que depressa se recompôs, evidenciando crescimentos subsequentes que mais que compensaram a tendência até aí verificada.

O que aí vem é uma enorme incógnita, todavia. Não necessariamente negativa, mas plena de incerteza.

O jogo está a mudar. Há quem o esteja a mudar, quem compreenda a mudança de regras e se mantenha nele e quem esteja a ser vítima dessa mudança, por incapacidade cognitiva, por teimosia na apreciação conservadora da situação ou por puro negacionismo. Neste cenário de transformação os vencedores e perdedores serão os que situarem na ordem que atrás referimos.

O que está a mudar então de forma estrutural, criando uma nova realidade? Essencialmente o consumo. Quem não souber ler os sinais do consumidor, afinal o grande ditador da indústria da moda, está a condenar-se a prazo, mais cedo que tarde. A verdade é que, numa indústria transformadora, em que a cadeia de valor afasta quem produz de quem compra o produto final, há a tendência de ignorar esta realidade, alegando que esse não é o seu negócio. Nada mais errado, nada mais fatal.

As empresas da ITV portuguesa estão historicamente vocacionadas a trabalhar com outras empresas e não com o cliente final. É esta a nossa especialização, construída em décadas de trabalho focado na atividade produtiva, aperfeiçoando a eficiência produtiva, a engenharia do produto e a inovação tecnológica, como forma de a qualificar e a diferenciar. Nada há de errado. Fizemos o que sabíamos fazer e com os meios que tínhamos à disposição. Resta saber agora se isso é suficiente para garantirmos um lugar no futuro, pelo menos tão luminoso como o que tivemos ao longo da última década.

A indústria da moda será o que o consumidor quiser que seja. Se não o conhecermos suficientemente não teremos argumentos para lhe responder, mesmo que seja por interpostas entidades, numa lógica de “private label”, antecipando produtos, processos e soluções.

Não sei como vai ser a ITV do futuro. Julgo que ninguém pode saber. Tenho, contudo, a certeza que será mais instável, mais complexa e exigente, obrigando a uma abordagem holística do negócio que obriga a conhecer o consumidor final muito melhor do que até agora parecia ser necessário. Será que a nossa indústria tem disso consciência e está a investir nesse domínio? As minhas fundadas dúvidas são simultaneamente o maior receio e o risco definitivo.

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