Transparência e criação de valor na ITV Portuguesa: um novo ciclo?
T81 - Março 23

Ana Paula Dinis

Diretora Executiva ATP
A

cadeia de valor do têxtil e vestuário é conhecida por ser bastante complexa, global e competitiva, tornando-se bastante desafiante quando falamos de transparência, rastreabilidade e partilha de valor.

Nós, na indústria, no meio da cadeia, somos confrontados diariamente com um poder negocial esmagador por parte das grandes marcas e cadeias de retalho que nos impõem, sem grande margem de manobra ou poder negocial, um caderno de encargos exigente, que obriga a investimentos e exige recursos que nem sempre são recompensados pelo cliente.

A verdade é que as empresas do nosso setor têm aderido, algumas de forma voluntária, muitas pressionadas pelos seus clientes, a um conjunto alargado de certificações de processo e produto que, entre outros, acabam por melhorar a transparência dos processos, garantindo aos clientes que para além de um produto de qualidade, o pacote da oferta inclui o cumprimento de um conjunto alargado de requisitos sociais, ambientais ou outros, para além dos elementares compromissos legais impostos pelo enquadramento jurídico em que se enquadram.

Mas o que temos lucrado com isso? Potencialmente, não perdemos os clientes, ganhamos outros, continuamos a ter encomendas, produção, mas conseguimos um bom retorno do nosso investimento? Estão os clientes a pagar o devido pelo “made in Portugal”? Por todo o know-how, inovação, desenvolvimento, engenharia de produto, sustentabilidade, responsabilidade social, qualidade, flexibilidade, serviço, valor acrescentado que oferecemos?

Sabemos que há uma tendência para que o consumidor esteja cada vez mais sensível aos temas da sustentabilidade, circularidade, responsabilidade social, mas na verdade também sabemos que pouca informação chega ao consumir final e a que chega nem sempre é fiável, comparável e suficientemente esclarecedora para que ele possa tomar uma decisão informada. Aliás, apesar dos investimentos que foram feitos, nomeadamente ao nível das certificações e auditorias, pouco serão os consumidores que estarão devidamente informados sobre o que os diferentes selos e rótulos quererão dizer. Ou seja, há aqui algum caminho a fazer, ou por parte das marcas ou por parte dos detentores dos esquemas de certificações. É preciso ir até ao final da cadeia, o consumidor final, aquele que no final toma a decisão de comprar ou não.

Toda esta transformação que temos vindo a fazer e que iremos continuar a fazer, nomeadamente ao nível da sustentabilidade e circularidade, não fará sentido se não for acompanhada por uma importante consciencialização e educação do consumidor final. A Estratégia Europeia para os têxteis sustentáveis aponta para essa necessidade e para a implementação de medidas nesse sentido.

Mas deverá a indústria deixar que esta comunicação, informação e consciencialização do consumidor fique apenas nas mãos das marcas e do retalho? Que tipo de mensagem e informação irão passar?

Não temos nós, a indústria, uma história para contar? Informação para partilhar?

Informação tem valor. E esta pode ser uma boa oportunidade para a indústria conseguir arrecadar parte deste valor para si.

Já sabemos que somos os melhores a produzir. Sem descurar esses créditos, agora é o momento de comunicar, partilhar informação, valorizar o “made in Portugal” e tirar o máximo proveito deste movimento.

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