A CRISE ENERGÉTICA
T74 - julho/agosto 22

Luís Mira Amaral

Presidente dos Conselhos da Indústria e da Energia da CIP-Confederação Empresarial de Portugal Membro do Conselho Consultivo da ATP
M

esmo antes da chocante invasão da Ucrânia, já se sentia no Mundo uma crise energética, aquilo a que temos chamado a primeira crise energética em contexto de descarbonização. Tal devia-se a um forte crescimento da procura por combustíveis fósseis, designadamente petróleo, carvão e gás natural, na sequência da retoma económica pós-covid, mas em nome da descarbonização tinham-se travado novos investimentos e novas produções de combustíveis fósseis criando uma tremenda pressão da procura sobre a oferta que tinha dificuldade em acomodar essa procura, levando ao disparo dos preços da energia nos mercados mundiais. 

Segundo o muito credível “Statistical Review of World Energy”, da BP, o consumo mundial de energia primária aumentou 5.8% em 2021 em relação a 2020, atingindo mesmo um nível mais elevado do que se tinha verificado em 2019 antes da pandemia, sendo até o nível mais elevado de sempre. Este aumento da procura foi muito puxado pelas economias emergentes e a as energias fósseis representaram mais de 82% do consumo de energia primária e mais de 61 % da produção de eletricidade no mundo.

A invasão da Ucrânia veio tornar evidente aos olhos do grande público tudo isto, exacerbando a crise energética que já se sentia antes dessa invasão.

Em Portugal, estamos a ter quase a tempestade perfeita. Temos tido pouco vento e fraca utilização da capacidade instalada da energia eólica, a seca extrema tem restringido a capacidade de produção hidroelétrica e fechámos prematura e temerariamente as centrais a carvão, pelo que no sistema elétrico estamos muito dependentes do gás natural e das importações de eletricidade de Espanha, levando a preços extremamente elevados da eletricidade para as empresas e para a indústria portuguesa. Também os elevados e estratosféricos preços do gás natural estão a ter fortíssimo impacto nas indústrias que utilizam diretamente o gás natural, como acontece com o setor da cerâmica e do vidro e com a industria têxtil e do vestuário, designadamente nos tingimentos e acabamentos.

O governo tomou então duas iniciativas:

Decreto-Lei nº 33/2022 de 14 de Maio (Plafonamento do preço do gás natural para a produção de eletricidade), fazendo recair sobre os consumidores beneficiários da medida – aqueles que estão sujeitos às variações dos preços da eletricidade no mercado grossista – o pagamento da diferença entre o preço do gás natural no MIBGÁS e o preço do gás limitado no início a €40/Mwh por este DL.  Chamamos Custo do Ajustamento a esse diferencial.

Assim sendo, são os próprios consumidores teoricamente beneficiários da medida, e não os produtores de eletricidade, a suportarem o Custo do Ajustamento, pelo que o benefício líquido para estes consumidores será apenas a diferença entre o preço no mercado grossista da eletricidade sem plafonamento e a soma entre o preço efetivo no mercado grossista com plafonamento e esse Custo do Ajustamento.

Decreto-Lei nº 30-B/2022 de 18 de Abril (Sistema de IncentivosApoiar as Indústrias Intensivas em Gás”). A ATP evidencia que o apoio aprovado (30% do custo elegível com um máximo de €400 mil /empresa) é bastante limitado e fica muito aquém das necessidades das empresas, pondo em causa a integridade de todo um setor, fundamental para a economia do país. Nas indústrias têxtil e de vestuário e na cerâmica e vidro há um número considerável de empresas com consumos médios mensais superiores a 1750 MWh e que ficarão muito penalizadas, uma vez que para estas os 400 mil € poderão representar 10% ou ainda menos do diferencial entre o valor pago em 2022 e o valor pago em 2021. Seria então fundamental, como a ATP chamou a atenção, que o apoio fosse numa % superior (no mínimo 50%, idealmente 70%) e sem qualquer tipo de limitação por empresa.

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