REVOLUÇÃO FEMINISTA NA ARTE: A ASCENSÃO DO TÊXTIL
T72 - Maio 2022

Cristina Rodrigues

Artista Plástica
O

têxtil é um material desde sempre associado ao universo feminino. Na minha infância, durante os anos 80, era costume as meninas terem aulas de lavores onde aprendiam tecelagem, bordados, costura, tricot e crochet. O têxtil foi-me imposto desde cedo como linguagem, como forma de expressão, e acredito que esta realidade é partilhada por outras mulheres que, como eu, encontraram nas técnicas têxteis a sua principal forma de expressão.

Na minha família, diferentes gerações de mulheres tiveram enorme proximidade com os têxteis e o desenvolvimento da minha produção artística também se sustentou através do referencial de técnicas que construí nas aulas de lavores e a observar essas mulheres. Esse processo tornou-se a base de muitas das técnicas de trabalho que utilizo hoje. Os têxteis assumem diversas formas na minha produção artística: fiber art, tapeçaria, tecelagem, bordado, tricot, crochet, estampados, entre outros.

Creio que várias artistas terão passado pelo mesmo processo. Um exemplo que considero notável é o da alemã Anni Albers (1899 – 1994), artista têxtil, pintora, designer e professora da escola de arte Bauhaus, que transformou o seu tear num veículo de inovação. Albers viu o potencial dos têxteis muito para além de um “artesanato feminino”, como eram entendidos na altura e, desde então, influenciou outros criadores, incluindo a artista plástica Sheila Hicks, entre outros designers de moda, como Paul Smith, Hermès e Roksanda.

Anni Albers combinou o antigo ofício da tecelagem manual com a linguagem e design da Arte Moderna criando um trabalho verdadeiramente inovador e único, uma geração à frente do movimento Fiber Art nos Estados Unidos e na Europa, e pelo menos duas gerações à frente das muitas práticas de Arte Contemporânea inspiradas no seu trabalho.

Na década de 1970, o movimento de libertação das mulheres e a ascensão da arte feminista trouxeram uma nova luz aos têxteis, que passaram a existir fora do espaço doméstico assumindo uma forma de expressão reconhecida e respeitada no mundo da arte.

A natureza flexível deste material, que pode existir nas mais variadas cores, padrões, texturas, estereotomias, e que permite facilmente assumir formas bidimensionais ou tridimensionais torna-o um suporte de expressão privilegiado. São precisamente estas características que fizeram com que a percursora do movimento feminista na arte, a norte americana Judy Chicago, utilizasse o têxtil como material de suporte de uma das mais importantes obras de arte deste movimento, a instalação “The Dinner Party” (1979). A base desta obra é uma série de toalhas de mesa bordadas a dourado com diferentes nomes de figuras femininas marcantes.

Outras artistas que levaram os têxteis a novos patamares no séc. XX incluem Sonia Delaunay, Judith Scott, Louise Bourgeois e, mais recentemente, Sarah Lucas e Tracey Emin. Bourgeois (1911 – 2010), em particular, criou diversas esculturas têxteis tridimensionais que representam a figura humana em diversos arranjos e disposições. Também Tracey Emin utilizou têxteis para produzir a sua famosa série de quilts com poderosas mensagens sobre a condição da mulher nos anos 90.

Como um amigo, os têxteis estiveram com as mulheres no obscurantismo e acompanharam-nas na sua ascensão.

Partilhar