Matem a galinha e depois queixem-se que não comem os ovos
T67 - Novembro

Miguel Pedrosa Rodrigues

Vice-Presidente da ATP
A

s medidas de alteração à Legislação Laboral apresentadas na conferência de imprensa do Conselho de Ministros de 21 de Outubro acabaram por ditar – e muito bem – a saída em bloco dos representantes da concertação social. A forma como foram pensadas e divulgadas pelo Governo é inaceitável e, como se não bastasse, algumas constituem um autêntico atentado às empresas.

Senão vejamos: 1) o condicionamento do acesso a apoios e incentivos públicos à existência de contratação coletiva dinâmica, ou seja, as empresas associadas da ATP (que não estão obrigadas a cumprir o CCT – Contrato Coletivo de Trabalho, porque simplesmente este já não existe) deixam de ser elegíveis; 2) permitir que qualquer das partes suspenda a caducidade das convenções, ou seja, depois de assinado um CCT, vai ser praticamente impossível a sua eventual renegociação equilibrada porque deixará de existir um final para o contratualizado; 3) alargar a contratação coletiva aos trabalhadores em outsourcing que trabalhem mais de 60 dias na empresa e aos trabalhadores independentes economicamente dependentes; é completamente irrealista que as empresas possam controlar esta exigência pela simples razão de que trabalhadores em outsourcing ou independentes não são funcionários da empresa; 4) tornar permanente o poder da ACT de suspender processos de despedimento com indicios de irregularidade pode constituir um sério problema, dado que a mesma alteração também prevê 5) acesso a apoios públicos, incentivos financeiros e fundos comunitários condicionados ao cumprimento de normas laborais.

Não demora a termos uma coisa a engalfinhar-se na outra e um investimento apoiado de uma empresa, gerador de crescimento e emprego, correr o risco de ser inviabilizado por um qualquer indício; por fim, 6) reposição dos valores de pagamento de horas extraordinárias em vigor até 2012 a partir das 120 horas anuais não seria o fim do mundo para as empresas e seria bom para os colaboradores, não se desse o caso de, por via da fiscalidade sobre as horas extras, o Estado levar fatia de leão. A tributação sobre as horas extraordinárias é um mal crónico que afeta empresários e colaboradores, e só o Estado e os partidos políticos é que não vêm.

Serve isto tudo para dizer que a ITV Portuguesa é boa, sim, mas não é de ferro. Passamos por desafios há décadas e temos sabido ultrapassá-los, mas desengane-se quem acha que tal não tem sido conseguido com muito sangue, suor e lágrimas. É mesmo esforço e competência de todos, empresários e colaboradores, mas quem anda nisto há algum tempo sabe também que o sucesso passado nada tem que ver com o sucesso futuro.

Parece que ao nosso Governo e partidos políticos não chega já uma pandemia? Uma concorrência asiática e turca numa guerra sem trincheiras aduaneiras, éticas, sociais e ambientais? Não chega já também o inacreditável aumento dos custos logísticos, das fibras, dos químicos, da energia e do gás?

Perdoem-me a falta de paciência, mas depois não se queixem que não há ovos se insistem em matar as galinhas.

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