Foi preciso uma guerra para discutirmos os problemas da energia
T71 - Março/Abril 2022

Mário Jorge Machado

Presidente da ATP
A

ATP tem sido a voz mais ouvida na luta pela defesa dos interesses das empresas no que diz respeito à crise energética que estamos a viver.

É uma situação crítica que começámos a acompanhar no final do ano passado quando os preços da energia elétrica e sobretudo do gás natural começaram a subir.

Foi a partir daí que reforçámos os nossos contactos com o Governo, sensibilizando para as dificuldades do setor e para as consequências desta situação não só para as empresas mais afetadas, mas para todo um setor (completamente interdependente) e para a própria economia nacional, mas sobretudo apelando à necessidade de se tomarem medidas urgentes e eficazes de apoio às empresas.

Nessa altura, apenas conseguimos uma redução nas tarifas de acesso às redes de energia elétrica e possibilidade das cogerações passaram a poder vender energia à rede a preços de mercado e não a preços fixos conforme estava estabelecido. Medidas ténues para a gravidade do problema que estávamos a enfrentar. Aparentemente para o problema do gás natural, cujos preços aumentaram 600%, o Governo nada podia fazer. São as regras do mercado internacional, nada podemos fazer, diziam os responsáveis políticos.

Precisamos de apoios diretos às empresas que não querem nem podem endividar-se mais e precisamos de um lay off mais flexível, o lay off simplificado, que possa responder às necessidades atuais das empresas que já se encontram a fazer paragens de produção, devido à enorme subida do preço do gás e à impossibilidade de repercutir este aumento nos clientes. Não podemos esquecer que atuamos num mercado altamente concorrencial e globalizado e facilmente os clientes internacionais, que procuram sempre o preço mais barato, encontrarão alternativas de fornecimento noutras geografias. É que apesar das regras serem definidas no mercado internacional, na verdade, todos sabemos que existem países cuja energia é bem mais barata do que em Portugal. E alguns deles são nossos concorrentes e já estão a beneficiar com o desvio de encomendas que normalmente deveriam ter ficado em Portugal.

Sobre os apoios diretos diziam-nos “apenas com a autorização de Bruxelas”, já sobre o lay off, “as empresas tem no Código de Trabalho um lay off que poderão utilizar”. Enfim, sempre muito disponíveis, mas pouca ação em prol da defesa de economia nacional!

Infelizmente, foi preciso acontecer uma guerra na Europa para que este assunto fosse de novo discutido em Bruxelas (e porque Portugal não é o único afetado) que acabou por autorizar os Estados -Membros a apoiar diretamente as empresas, mas também a discutir a implementação de tetos máximos de preços para a energia ou a reformulação da fórmula do preço, bem como a interconexão das redes de aprovisionamento para que se possa falar de um verdadeiro mercado único, já para não falar da extrema dependência da Europa num recurso fundamental para a economia europeia. 

É difícil perceber que se fechem centrais a carvão, quando não estão garantidas as condições de fornecimento alternativo. É também difícil perceber como é que Portugal, um dos países que mais tem investido nas energias renováveis, continua a ter uma das energias mais caras da Europa…

Não podemos falar em descarbonização da economia e da indústria, sem falar em competitividade das empresas. Se querem que as empresas invistam na descarbonização, é fundamental que haja uma relação de custo-benefício que promova esse investimento! 

Para empresas que concorrem no mercado internacional, como é o caso do setor têxtil e vestuário, a sustentabilidade terá sempre de estar alinhada com a melhoria da sua competitividade. E enquanto essa não for uma verdadeira prioridade, não andem a dar tiros nos pés!

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