As mudanças sistémicas da indústria da moda
T44 - Junho 19

Ana Roncha

Diretora do mestrado
em Strategic Fashion Marketing
no London College of Fashion
A

indústria da moda pauta-se hoje em dia pela abertura de novos mercados e segmentos e acima de tudo pela existência de ecossistemas que originam novas formas de gerir, criar valor e dialogar.

Globalmente assistimos a um universo cada vez mais competitivo, com novos players a surgir todos os dias e onde o poder é dado a um ‘novo consumidor’ com características muito próprias e diferentes das anteriores gerações. A grande mudança dos tempos em que vivemos é talvez a consciencialização de que este mesmo consumidor é, acima de tudo, uma entidade criadora de valor para as marcas com que interage.

Os grandes drivers da mudança assentam em três fatores fulcrais: mudanças comportamentais, crescente inovação tecnológica e mudanças sociais. Estas mudanças deram lugar a modelos de negócios disruptivos, mas acima de tudo “future proof” – preparados para novos contextos e realidades.

Relativamente às mudanças comportamentais podemos destacar expectativas cada vez mais elevadas assim como graus de envolvimento mais acentuados nos variados processos, desde a conceção até à divulgação de marcas e produtos preferidos.

Vivemos uma cultura do imediato, em que o consumidor é vez mais impaciente, o que implica que as marcas operem com timings (seja design, produção ou distribuição) cada vez mais curtos. Se em 1995 o consumidor médio considerava esperar cerca de 9 dias pela entrega de um produto na Amazon, em 2018 esse tempo encurtou para escassas 24 horas.

Estas expectativas elevadas de qualidade e rapidez de serviço, transmitem-se para todos os setores e segmentos.

Esta impaciência manifesta-se também na cultura da novidade e da antecipação, assente em novas formas de distribuição e comunicação – caso da cultura “drop” que abrange desde marcas streetwear até às marcas de luxo.

O ritmo crescente das inovações tecnológicas e a adoção de ferramentas disruptivas têm vindo a alterar a dinâmica da indústria moda. É necessário perceber as mudanças que estas tecnologias trazem e o que permitem atingir. A tecnologia abre inúmeras potencialidades para personalizar a experiencia de compra e acelera a capacidade de oferecer uma comunicação e serviço mais personalizado.

Dentro das mudanças sociais podemos englobar aspetos relacionados com as preocupações ambientais, com a responsabilidade social e sustentabilidade, a cada vez mais instável situação politica à escala global ou questões ligadas aos recursos humanos e a novas formas de trabalhar.

O fator de maior destaque, no entanto, passa sem duvida pelas preocupações éticas e de sustentabilidade.

A crescente transparência é um fator decisivo nesta mudança. Numa industria que sempre se pautou por ser altamente secretiva, é refrescante ver marcas a divulgar as margens utilizadas na construção do preço assim como divulgar informação sobre os seus fornecedores.

Ética e sustentabilidade são parte integrante do novo mindset de consumo, em que o respeito pelas pessoas e planeta são tao importantes quanto a oferta estética da marca em questão.

Precisamos de soluções transformativas e inovadoras, modelos de negocio que tenham como foco não só a sustentabilidade financeira do negócio mas a busca de relevância, de um propósito social.

As marcas com mais potencial de serem bem-sucedidas neste caminho são as que não têm medo da inovação, de se tornar disruptivas, de se questionarem e as que adotarem novas capacidades e conhecimentos que lhes permitam estarem preparadas para esta nova era de consumo onde a transparência impera.

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