Alguns compromissos têm de ser revistos
T20 Maio 2017

Maria José Carvalho

Diretora do Departamento de Produção Sustentável do CITEVE
O

s produtos químicos, no Sector Têxtil e do Vestuário, têm estado sob as luzes da ribalta, particularmente nos últimos 10 anos.

O primeiro acontecimento, que mudou a forma como as substâncias químicas passaram a ser olhadas, foi a publicação, no final de 2006, do Regulamento REACH (registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas). Este Regulamento (CE 1907/2006), passou a definir as obrigações associadas às substâncias químicas, estremes, em misturas e em artigos.

Até então, a legislação associada a substâncias químicas era vista como obrigações para as empresas de produtos químicos. No entanto, a inclusão, no Regulamento REACH, das substâncias em artigos, alarga o seu leque de aplicação a empresas que produzem artigos, como por exemplo, os têxteis.

Por outro lado, registou-se um aumento dos cadernos de encargos com inclusão de RSL (listas de substâncias restritas), normalmente com substâncias químicas que não podem estar presentes nos artigos têxteis, que são fornecidos aos clientes. Em alguns casos, incluem também substâncias que não podem ser usadas nos processos produtivos.

Mais recentemente, em junho de 2011, a Greenpeace lança a campanha Detox, cujo principal objetivo é retirar da cadeia de fornecimento têxtil, até 2020, um grupo de substâncias consideradas perigosas. Surge ainda, com um objetivo similar, o programa ZDHC (Zero Discharge Hazardous Chemicals). Quer a campanha Detox quer o ZDHC foram assumidos por algumas das maiores marcas mundiais que, ao se comprometerem com estes objetivos, solicitam à sua cadeia produtiva comprovativos do cumprimento dos requisitos associados a estes movimentos.

Em 2012, surge um novo Regulamento da União Europeia, relativo a produtos químicos, neste caso, e mais especificamente, os produtos biocidas (Regulamento UE 528/2012, também conhecido como Regulamento BPR). Este Regulamento diz respeito à colocação no mercado e à utilização de produtos biocidas, que são usados para proteger seres humanos, animais, materiais ou artigos contra organismos prejudiciais, como parasitas ou bactérias, através da ação de substâncias ativas contidas no produto biocida. Incluindo os artigos têxteis que têm alguma ação biocida.

Mesmo não tendo referido todas as alterações ocorridas em relação a substâncias químicas, e focando apenas nos requisitos legais da União Europeia, torna-se evidente que, para responder a todas as solicitações, as empresas têxteis necessitam de uma pessoa dedicada a esta matéria e com competências específicas em química. Claro que, esta necessidade é mais relevante nas empresas têxteis com uso intensivo de produtos químicos, como tinturarias, acabamentos, estamparias, revestimentos, etc.. No entanto, este não é apenas um “problema” das tinturarias, como muitas vezes se ouve, quando se fala de produtos químicos. As empresas de fiação, tecelagem, tricotagem e confeção, entre outras, embora usem menos produtos, em quantidade e tipo, não deixam de os utilizar e, não raras vezes, com riscos elevados para a saúde humana e/ou o ambiente.

Percebo claramente o desabafo de alguns técnicos das empresas, questionando por que é que não existe um referencial único para o Sector Têxtil e do Vestuário. De facto, era ótimo, porque isso facilitaria o trabalho nas empresas e as horas de análise de informação, com os custos associados. E complementam: se temos os artigos têxteis com a certificação STANDARD 100 by OEKO-TEX® e cumprimos com o Regulamento REACH, não podemos assumir que cumprimos tudo? Sim, isso ajuda, mas não responde a todas as exigências. Há sempre pontos em comum entre os referenciais, legislação, cadernos de encargo, etc., mas existem também requisitos específicos em cada um deles.

É de facto um desafio para as empresas do Sector Têxtil e do Vestuário que, face às dificuldades não só de análise da informação, mas, em alguns casos, de garantia do cumprimento dos requisitos, devem ter uma voz única e com apoio dos fornecedores de produto químicos, numa verdadeira parceria, para que consigam provar que alguns compromissos terão de ser revistos, por não ser atingíveis até 2020.

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