A ITV dentro de uma Geração
T41 - Março 19

João Peres Guimarães

Membro do Conselho Consultivo da ATP
C

omo será a indústria têxtil e de vestuário em Portugal dentro de uma geração? Que estratégia deve ser traçada agora para poder subsistir aos desafios do futuro?

Num mundo cada dia mais globalizado será a evolução deste – não apenas de Portugal ou a Europa – a condicionar o desenvolvimento do comércio e produção.

Actualmente, no vestuário, sobrevivemos graças à rapidez. Nas entregas e na adaptação à moda. E moda não é apenas o aspeto ou a etiqueta dos produtos. É também o uso dos “reciclados”, a economia circular, os produtos ditos “orgânicos”, a eletrónica incorporada no têxtil e por aí fora.

Mas o que tem que ser tem muita força. E vai mudar completamente o paradigma da nossa indústria. A sustentabilidade deixará de ser apenas uma imagem que vende mas uma efetiva necessidade.
Numa geração a população mundial deverá crescer 30% (de 7,3 para 9,5 mil milhões de humanos). Para a nossa indústria não significará muitos mais clientes já que este crescimento terá lugar em países em desenvolvimento e os nossos produtos não têm como alvo esse mercado. Mas essas pessoas terão necessidade de comer o que implica a necessidade de mais solo arável e maior consumo de água, cuja escassez será aguda nessa altura. Significará o adeus aos “orgânicos” (que gastam no mínimo o triplo dos “normais”) e talvez mesmo aos naturais (a cultura de 1 Kg de algodão necessita de cinco mil lts de água). Nos media já há programas a propagandear a insustentabilidade da área da moda, a condenar o seu excessivo consumo de água e o desperdício associado à elevada rotação do vestuário.

Atualmente vende-se bem, por exemplo, poliéster reciclado proveniente de garrafas em PET. Se tiverem sido recolhidas no mar ainda melhor. Bom, é aproveitar, pois não tardará o momento em que, contas feitas, se verificará que na sua reciclagem o consumo de energia associado à sua apanha, lavagem, fusão e produção é superior ao de um fio novo. E a economia circular, com todos os consumos na coleta, triagem, separação e reprocessamento seguirá o mesmo caminho. Lembram-se dos biocombustíveis? Era a salvação mas agora todo o mundo evita tocar no assunto pois as desvantagens já ultrapassam os benefícios.

O problema está a tornar-se demasiado grave e o futuro, de um modo premente, obrigará a repensar estas medidas que, sendo bem intencionadas, não são eficientes.

Para a têxtil significará a substituição da fibras naturais por sintéticas e artificiais. Estas ultimas, pelas suas características tão próximas das naturais, serão a base do têxtil de alta gama, o nosso mercado alvo na moda e no têxtil lar.

O território português não tem grande apetência agrícola mas possui boas características para a produção florestal, em particular pinheiro e eucalipto, exatamente o tipo de árvore cuja polpa serve de base à produção de viscose e fibras derivadas.

Esta indústria, outrora bastante poluente, tem hoje uma excelente pegada ecológica, consome muito menos água que a cultura de algodão e permite o aproveitamento de terrenos impróprios para a agricultura.

Portugal peca por não produzir matérias-primas para aquela que ainda é uma das suas principais áreas de atividade. Está na altura de reverter esta situação para poder enfrentar os desafios do futuro com maior tranquilidade.

Sei que os investimentos necessários são elevados e as parcerias com outras indústrias (papel, por exemplo) e com o Estado (dono de grande parte da floresta) serão difíceis.

Mas penso que este é um passo importante para manter a nossa ITV sustentável e próspera.

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