A industrialização na secretaria
T53 - Maio 20

Noel Ferreira

Membro da Direção da ATP
A

vontade de (re)industrializar está aí. A pandemia sacudiu as mentes e eis que os dirigentes europeus deram conta que a Europa limpa, imaculada e a viver apoiada no setor terciário é uma utopia. Temos assistido a uma redução do contributo industrial no produto europeu ao longo dos últimos anos. A indústria desinteressou uma vaga de políticos e houve uma depuração. Ficaram, em abono da verdade, as empresas tecnológicas de alto valor acrescentado. No que respeita à indústria Têxtil, Portugal manteve o produto (após um período mais difícil) mas com mais valor acrescentado. Reduziu a metade o peso relativo das exportações. Foi a debandada para o Extremo Oriente sem esquecer a vizinha Turquia, embora não fosse novidade. Se é para reverter a desindustrialização, como resolver esse novo rumo na secretaria?

Porque não reescrever a História da Indústria na Europa, a de Portugal em particular? Com o que capitalizamos com tanto sacrifício ao longo destes anos e que nos conotou de tantos e bons adjetivos (resiliência, inovação, competência, capacidade de adaptação, etc.), teríamos bons motivos para encarar o futuro com mais otimismo. Porém, essa mudança é desafiante devido a vários fatores:

1 – Muitos anos a dar o flanco para sermos ultrapassados e agora temos o contributo do Extremo Oriente em (quase) tudo o que tocamos. O vinho do Porto ainda não mas o presunto de Parma sim.

2 – Mão-de-obra. As regras não são as mesmas por cá. Os trabalhadores têm direitos e proteção. Por lá, ditaduras. Trabalha-se de sol a sol, seis dias por semana a troco de um salário miserável.

3 – Política ambiental – Investimos/pagamos caro em certificações, alterações de processos e uma panóplia de requisitos legais e das políticas dos clientes. Essa é a postura correta. Tem sido uma revolução à medida da consciência ambiental que nos dá um avanço significativo, mas funciona como uma armadura pesada ao competirmos com outras geografias.

4 – Energia – Cara qb mas muito verde. Mais um peso na armadura.

5 – Financiamento – reversão do estatuto de persona non grata, embora já tenha sido pior aquando da última crise. Essa era sistémica e derivou de muita asneira, ganância e falta de escrúpulos levada a cabo por mentes criminosas. A covid-19, não.

Há um conjunto de políticas (as cinco acima são apenas uma parte) a encetar e que até podem não agradar a todos numa Europa tão dividida. A tarefa será árdua e vai levar tempo. Sempre foi mais fácil destruir do que construir.

Diria que é uma oportunidade de ouro porque Portugal é muito melhor que aquilo que reflete no valor percecionado mas esse assunto merece ser desenvolvido noutro artigo.

Poderíamos ganhar alguns dos quase 50 anos que estivemos mergulhados na escuridão salazarista – “pobres, mas honrados”. Mas esse caminho já está a ser percorrido por grandes empresas (não necessariamente empresas grandes) que vendem bem os seus produtos.

Essa é a prova que sabemos fazer, mas falta-nos muito caminho. Valha-nos a margem de progressão, que é imensa.

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