A democracia das cores
T16 Janeiro 2017

José Morgado

Diretor do Departamento de Engenharia e Tecnologia do CITEVE
A

o longo da nossa história muitos foram os que estudaram a cor e analisaram a sua influência na nossa vida, com destaque para Aristóteles, Isaac Newton, Goethe ou Albert H. Munsell. De uma forma geral todos concluíram que a cor é um fenómeno fisiológico, de caráter subjetivo e individual.

De facto, a cor é um dos elementos que está sempre presente no nosso quotidiano, manifestando-se no ambiente que nos rodeia, naquilo que comemos e, sobretudo, no que vestimos. Nas ações de formação que vou ministrando costumo dizer que a cor é a primeira coisa que impulsiona a compra e nos faz entrar ou não na loja para então analisar o toque ou o cair de determinada peça de roupa. Alguns dos formandos reagem a esta provocação e dizem-me que a priorização das etapas não é bem esta e que muitas vezes olham logo para o preço e esquecem as restantes fases. No entanto, todos concordam que a cor é mesmo uma caraterística importantíssima no vestuário, que nos diferencia e distingue dos demais.

Podemos dizer, ou dizerem-nos, que não temos gosto e que não ligamos ao que vestimos ou ao que os outros vestem, mas uma coisa é certa: todos temos as nossas cores preferidas e todos reagimos positivamente ou negativamente à cor do vestuário. Apesar de existirem determinados rituais e usos que por vezes tentam limitar o uso da cor, sejam eles religiosos, políticos ou simples preferências clubísticas, o certo é que a cor é ainda um fenómeno individual e também por isso “democrático”.

As marcas de vestuário, conhecedoras destes fenómenos, tentam explorar ao máximo a influência da cor e a sua estratégia passa muitas vezes por induzir os seus clientes a uma associação a determinados padrões de cor esquecendo outras caraterísticas importantes como a resistência, durabilidade e usabilidade das peças por si lançadas.

Esta necessidade de lançamento de novas e “sensacionais” cores, de forma sistemática e diferenciadora, traz novos desafios ao processo industrial de tingimento e obriga à investigação permanente por parte de todos os atores que participam na coloração dos substratos têxteis.

Os fabricantes de corantes e pigmentos, além dos habituais corantes sintéticos, procuram já alternativas sustentáveis e industrializáveis nos corantes naturais. Os fabricantes de equipamentos, a par da preocupação constante de apresentar tecnologias que permitam elevada qualidade de tingimento e redução de custos, são hoje obrigados a investigar outras formas de tingimento que podem passar pela utilização de novas e inovadoras tecnologias de preparação e acabamentos, pela utilização de tecnologias ultrassónicas para aceleração do processo, pela utilização de fluídos supercríticos em substituição dos solventes usualmente utilizados, ou ainda pela incorporação real dos conceitos da indústria 4.0 nos seus equipamentos.

As empresas de tinturaria deverão ser capazes de absorver estes novos conhecimentos e adaptar-se a esta realidade, sabendo que é nova mas que ficará “fora de moda” assim que os investigadores encontrem outras formas de incorporar ou induzir cor nos substratos têxteis sem recurso aos processos convencionais.

A estas questões tecnológicas temos necessariamente de acrescentar as novas imposições e realidades incontornáveis da moda, da sustentabilidade e da economia circular.

Por tudo isto, penso que a cor, a sua compreensão e principalmente a sua incorporação em substratos têxteis, continua a ser hoje o maior desafio que se apresenta à indústria têxtil. Vale a pena pensar se estamos preparados e conscientes das mudanças que o futuro nos reserva de forma a que a nossa indústria continue na linha da frente da democratização das cores

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