Com 49 anos de idade, Micaela Larisch sempre foi uma apaixonada pelo ballet. A paixão por esta arte, que entretanto esteve hibernada durante um quarto de século, viria a ressuscitar, não nos palcos mas nos bastidores, quando em meados dos anos 90 a desafiaram a fazer o guarda-roupa para um espetáculo de ballet.
s olhos de Micaela brilham de orgulho quando mostra o tutu que Filipa Castro, a primeira bailarina da Companhia Nacional de Bailado, usou para dançar o D. Quixote no Teatro del Canal em Madrid. É uma peça assombrosa, ao mesmo tempo exuberante, confortável, simples e prática, que lhe exigiu uma semana de trabalho.
“Em palco, os bailarinos só têm de pensar na coreografia e na dança. Não podem preocupar-se com um fato que pica, lhe tolhe os movimentos ou não deixa o corpo respirar”, explica Micaela Larisch, 49 anos, que se especializou na conceção e produção de vestuário para ballet e outras artes.
A paixão de Micaela pelo ballet tem quase a mesma idade que ela, mas hibernou durante um quarto de século. Um problema nos rins, detetado quando ela tinha cinco anos, liquidou-lhe o sonho de ser bailarina. “Foram muitas as noites em que sonhei que estava a dançar em pontas”, confessa. A paixão viria a ressuscitar, não nos palcos mas nos bastidores, quando em meados dos anos 90 a desafiaram a fazer o guarda-roupa para um espetáculo de ballet.
Micaela nasceu em Coimbra, onde cresceu numa quinta com cavalos, galinhas e vacas, sendo a mais nova dos sete filhos do matrimónio entre Branca, professora licenciada em Germânicas, e o alemão Helmut Gaston Larisch, um farmacêutico industrial de Hamburgo que estava de férias em Espanha quando foi surpreendido pelo deflagrar da 2ª Guerra Mundial e tomou a sábia decisão de se refugiar em Portugal, onde fez carreira como professor de alemão na Faculdade de Direito.
Uma óbvia preferência pelas manualidades, levou-a, no final do liceu, a trocar Coimbra pelo Porto, onde fez o curso de Estilismo no CITEM, concluído em 1986, o ano da CEE e de uma primeira arrumação da vida de Micaela, que casou três dias depois do desfile de final de ano.
Durante um ano, andou entre Coimbra e o Porto, onde foi assistente da professora do primeiro curso de Estamparia no Cenatex, o primeiro emprego, mas não o primeiro trabalho, pois, elétrica como sempre foi, atravessou a adolescência a fazer biscates – com 12 anos vendia pelo telefone assinaturas do Diário de Coimbra (de que o avô materno tinha sido fundador) e aos 15 vamos encontrá-la como hôtesse a receber sozinha o PR Ramalho Eanes no stand da Sibelco na feira comercial e industrial de Coimbra.
Para estar mais próxima da têxtil, deitou âncora no Porto onde foi navegando à deriva, entre biscates diversos (uma firma de material informático, a empresa de sinalética do marido), até se abalançar a fazer uma coleção de roupa para criança, com marca própria (Reguilas). “Não me encontrava comigo. Não estava verdadeiramente feliz”, recorda.
A Reguilas não teve um sucesso estrondoso mas foi o Abracadabra que lhe proporcionou o reacender da velha paixão. No final do desfile, uma professora de ballet perguntou-lhe se não podia fazer o guarda-roupa para um espetáculo, e a partir daí as encomendas começaram a surgir, umas atrás das outras, como as cerejas. “Senti que estava a trilhar um caminho meu”, conta.
Vinte anos depois, Micaela Larisch é não só um nome no Cartão do Cidadão mas também uma prestigiada marca de roupa para ballet e uma empresa, que “tem o carinho do atelier mas é realmente industrial”, emprega dez pessoas, é vertical (“começa no desenho e sai caixote”) e tem uma flexibilidade que lhe permite fazer desde peças únicas (como o maravilhoso tutu que Filipa Castro usou em Madrid) até básicos em grande quantidade.
“Temos capacidade para grandes produções. Executamos encomendas em 15 dias. Trabalhamos para espetáculos com dia e horas marcados, em que meia hora de atraso é tarde de mais. Sabemos as necessidades dos bailarinos, que têm de mudar de figurino em três minutos”, conclui Micaela, uma espécie de dínamo humano, que se sente com a idade dos filhos e garante que aos 90 anos ainda vai andar por aí a trabalhar.
Família Casada com um empresário de sinalética (Letratec), tem dois filhos, o Filipe, 26 anos, especialista em multimédia, e Bernardo, 23, músico e compositor Formação Curso de Estilismo do CITEM (1986) Casa Apartamento em Leça da Palmeira Carro VW Golf Portátil Lenovo Telemóvel iPhone Hóbis “Ser workaholic não me deixa muito tempo livre, mas adoro conviver com a família e os amigos à volta de uma boa mesa de refeição” Férias Há muito tempo que não iam ao Algarve, mas no ano passado estiveram lá uma semana, sem pressão, a desfrutar do tempo Regra de ouro “Não me chega fazer bem, tenho sempre de fazer de maneira diferente”