É avançar ou morrer. O digital já não é o futuro, mas antes um caminho por onde alguns já rolam em alta velocidade. Com a revolução em marcha, esta é uma tendência que vai crescer rapidamente e na qual a ITV portuguesa tem condições para caminhar na linha da frente. O que agora faz falta, todos estão de acordo, é encarar este novo paradigma e olhar em frente. Depressa, por favor.
Raposo Antunes
O caminho faz-se caminhando. O verso do poeta andaluz António Machado poderia servir de mote para o novo paradigma que a indústria têxtil e do vestuário (ITV) tem de encarar – a economia digital. Essa caminhada, no entanto, tem de fazer-se em marcha acelerada se as empresas portuguesas não quiserem perder um comboio que já está a rolar a velocidade de cruzeiro e que, nalguns casos, vai mesmo em alta velocidade.
Nas empresas portuguesas contactadas pelo T Jornal, ninguém tem dúvidas que a economia digital é não só o futuro como é já mesmo o presente. E quem não se adaptar corre sérios riscos de sobrevivência. “Hoje uma parte da economia B2C (business to consumer) e B2B (business to business) é digital e as opiniões são unânimes que esta tendência vai crescer acentuadamente”, sublinha Mário Jorge Machado, CEO da Adalberto Estampados.
Este engenheiro de Polímeros licenciado pela Universidade do Minho (1985), que se habituou a prever o futuro e antecipar o que vai acontecer quando jogava xadrez a nível federado, não tem dúvidas: “As empresas que não se adaptarem a esta realidade (economia digital) e aos novos modelos de negócio irão ter muitas dificuldades e eventualmente desaparecer”.
Mário Jorge Machado questiona mesmo se a pergunta a ser colocada pelo T Jornal “não devia ser – Como é que a indústria têxtil e de vestuário se deve adaptar para gerar valor e resultados com uma economia cada vez mais digital?”.
O CEO da Adalberto Estampados, líder europeia na arte de estampar, dá mesmo exemplos daquilo que deve ou não ser feito para entrar a todo o gás nesse novo paradigma da ITV. “Um bom exemplo do que não se deve fazer são alterações, como as propostas à legislação laboral, que vêm introduzir mais rigidez no sistema quando o mercado exige mais flexibilidade às empresas”, aponta.
Pelo contrário, Mário Jorge Machado dá como bom exemplo do que se deve fazer “a formação aos dirigentes e quadros das empresas nos novos modelos de negócio com as oportunidades e ameaças que vamos enfrentar”. E sugere mesmo uma intervenção do Governo: “Sendo esta formação crítica para a
indústria, devia o governo com as associações empresariais e escolas de negócio e universidades criar um programa especial, para dirigentes e quadros com incentivos adequados”.
José Cardoso, CEO da empresa O Segredo do Mar, explica que a economia digital assenta parte das suas razões de sucesso na capacidade anunciada de entender a evolução das necessidades dos consumidores e de conseguir criar cenários e realidades na prestação de serviços e de entrega de produtos adaptados aos resultados obtidos por essa gestão de informação.
Para isso, diz, “é necessário elevada rapidez, flexibilidade, inovação, capacidade de produção integrada, qualidade e meios certificados associados numa zona económica e politicamente estável, de preferência com meios logísticos modernos, em suma, o exacto perfil da nossa ITV nos dias que correm”.
Para provar a sua tese, José Cardoso dá os exemplos das maiores plataformas de vendas online à escala global: “Quanto ao conhecimento que os gigantes Amazon, Asos, Zalando, Alibaba têm sobre esta capacidade instalada e disponível, pode-se aferir pelo volume de produção que colocam atualmente em Portugal ou pensam colocar”.
E sobre esta importante relação entre interesses e capacidades, o CEO da empresa O Segredo do Mar entende que ainda existe um longo caminho de aproximação a desenvolver e cimentar, tanto por parte das entidades governamentais e associações como por parte das empresas do sector.
Daí que José Cardoso lembra que está à porta um novo Web Summit, “uma oportunidade única para os nossos embaixadores desenvolverem estas novas ligações entre uma indústria atualizada e dinâmica e as novas plataformas de negócios ditas revolucionárias nos modos e costumes”. “A iniciativa é global, tal como é a nossa vontade”, enfatiza.
Carlos Serra, CEO da Troficolor, também não tem dúvidas que, genericamente, a indústria têxtil portuguesa possui as capacidades técnicas e tecnológicas necessárias para enfrentar os desafios da economia digital.
No entanto, sublinha o administrador desta empresa especializada em denim, “é necessário que os meios humanos sejam capazes de acompanhar o desenvolvimento, cabendo aos próprios empresários a responsabilidade de dotar os respectivos colaboradores de ferramentas para enfrentar os novos desafios”.
Teresa Marques Pereira, Brands Developer do grupo Valerius, tem ainda dúvidas sobre o grau de preparação da ITV portuguesa. E à pergunta do T Jornal (“Está a ITV portuguesa preparada para os desafios da economia digital?”), responde: “Creio que ainda não, mas num futuro a curto prazo terá que se render”.
Considera assim que antes de mais a ITV tem que perceber que é imperativo mudar de paradigma. “Precisamos de mudar a infraestrutura tecnológica e criar redes eficazes e proporcionais aos desafios que a economia digital nos coloca”, aponta.
Um dos principais desafios, segundo Teresa Marques Pereira, é entender o relacionamento “aberto” que tem de ser adoptado. “Viver num ‘só mundo’ e comunicar num pensamento global e pequenas adaptações locais. Outro é o nosso olhar sobre os nossos concorrentes, afinal a era digital veio ditar o ‘jogo limpo’ e o que importa é perceber onde estão os melhores recursos e janelas de oportunidade. Quem chega primeiro e deteta a oportunidades chega mais depressa ao mercado”, diz. E acrescenta: “O digital obriga-nos a estar sempre presentes, atuais, atentos à fluidez de comunicação e especialmente gerir eficazmente a informação! É, sob o meu ponto de vista, o recurso mais importante a ser trabalhado porque é dele que podemos retirar vantagens competitivas e criar maior dinâmica”.
De uma forma sintética, mas que resume bem o tom geral dos players ouvidos pelo T Jornal, o director-geral do CITEVE, Braz Costa, manifesta confiança no futuro: “A ITV portuguesa não está em pleno na economia digital, mas tem condições para fazer caminho na linha da frente”. Ou, como diria Machado, o caminho faz-se caminhando. E depressa, por favor.