T80 - Fevereiro 23
Empresa

Coelima: um farol inovador de responsabilidade social

Aprendiz de sapateiro ainda criança, Albano Coelho Lima foi ajudante de calandrador e chefe de armazém antes de se aventurar a ser empresário têxtil, aplicando as suas poupanças na compra de um velho tear manual, que foi o ponto de partida para a ascensão, declínio e queda do império Coelima - que deixa como principal legado uma inovadora e generosa política social

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Estávamos em 1922, quando Albano, o filho de meio de sete irmãos Coelho Lima, tentou a sua sorte ao aplicar as poupanças, religiosamente reunidas, na compra de um velho tear manual que pôs a trabalhar na sua própria casa – que na altura ninguém adivinharia se tornaria berço onde nasceu o que, algumas décadas mais tarde, se viria a dar pelos nome de Coelima e ser um potentado nacional e internacional dos têxteis lar, que chegou a empregar mais de 3 500 trabalhadores.

Nascido numa família humilde (e numerosa), Albano ainda era criança quando começou a ajudar o pai que era sapateiro, enquanto nas (poucas) horas vagas evidenciava os seus dotes musicais na Banda de Pevidém. A música foi uma paixão que o acompanhou ao longo da vida, ao ponto de ter criado o Órfeão Coelima.

Ajudante de calandrador durante a adolescência, o fundador da Coelima ganhou experiência industrial como chefe de armazém da fábrica Francisco Inácio da Cunha Guimarães & Filho, antes de aos 32 anos se abalançar a ser industrial e trabalhar por conta própria.

No início, Albano Coelho Lima comprava o fio e produzia as telas que vendia às fábricas. Ao longo dos anos 20, era esta a atividade essencial da empresa, que daria o grande salto em frente nas décadas seguintes, quando, já com a ajuda dos filhos, instalou no Lugar do Miral uma fábrica inovadora, apetrechada com quatro teares mecânicos – o início de um magnifico e moderno parque industrial que chegou a ter 100 teares, dos quais dois automáticos.

Após várias décadas de crescimento contínuo e exponencial, o declínio da Coelima coincidiu com o pós 25 de Abril, quando em vez de optar pela prudência, a empresa investiu fortemente, como o ilustra o facto de entre 1974 e 1980 ter duplicado o número de trabalhadores, de 1 500 para mais de 3 000.

“Crescemos mal”, diagnostica Adelino Coelho Lima, o último administrador da Coelima pertencente à família fundadora. Os ventos não sopravam de feição e a empresa acabou por ter de ser resgatada pelo Governo de Cavaco Silva, saindo assim das mãos dos descendentes de Albano Coelho Lima e iniciando um acelerado processo de downnsizing.

Os Coelho Lima, descendente de Albano, sairam da Coelima, mas o apelido Coelho Lima continua a ser incontornável na indústria dos têxteis lar, já que a maior empresa portuguesa do setor, a Lameirinho, foi fundada nos anos 40 por Joaquim, irmão de Albano.

As proezas da equipa de ciclismo da Coelima tornaram o seu nome conhecido de todos os portugueses, mas o principal legado da empresa são, sem dúvida, as preocupações sociais que Albano Coelho Lima evidenciou durante a regime salazarista – e que lhe valeram uma significativa homenagem póstuma, em 1989, dez anos volvidos sobre o seu desaparecimento, quando foi inaugurado na fábrica um monumento com um busto seu, integralmente pago pelos trabalhadores.

No tempo de um Estado Novo que podia ser tudo menos um Estado Social, a Coelima foi pioneira ao dispor de serviços sociais, permitir uma comissão de trabalhadores e instalar na empresa um posto médico, com serviços de medicina geral e familiar e medicina dentária.

A Coelima também foi inovadora ao criar uma cantina onde os trabalhadores faziam as suas refeições e um supermercado cooperativo com preços bonificados, onde os seus funcionários se abasteciam de géneros alimentares.

A habitação foi a cereja no topo do bolo do projeto social da Coelima, com a construção, numa extensa área contígua à fábrica, de um bairro com residências unifamiliares, que os trabalhadores podiam adquirir com financiamento assegurado pela entidade patronal.

Uma das principais impulsionadoras do horário de trabalho diário de oito horas e da fixação de um salário mínimo, a Coelima foi ainda pioneira no estabelecimento de um fundo de pensões para os seus trabalhadores. Um belo legado para um homem que debutou ainda criança no mundo do trabalho, como aprendiz de sapateiro.

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