5 dezembro 19
Debate Fórum Têxtil

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Quatro mandamentos para prosperar na nova década

Ser ágil, flexível e credivelmente sustentável são três mandamentos obrigatórios para sobreviver e prosperar num mundo em que a incerteza é a a única certeza, os ciclos são cada vez mais curtos e as disrupções cada vez mais frequentes. Esta é a grande conclusão do debate com que encerrou o painel 2 (Estratégia ITV 2025) do Fórum Têxtil.

Num momento em que há quem venda gato por lebre e está em crescimento o recurso ao greenwashing, a diferença estará em ser credivelmente sustentável e transparente, disponibilizando ao consumidor a rastreabilidade completa na cadeia de valor – alertou Lurdes Brandão, auditora da SGS Portugal, especializada em economia circular e as questões ambientais. 

Qualificação, internacionalização, inovação e tecnologia, design e sustentabilidade –  os cinco eixos de desenvolvimento futuro da ITV portuguesa –  estiveram em cima da mesa de um debate que também contou coma presença de Fernando Mascarenhas (sócio da KPMG), João Almeida (administrador da JF Almeida), José Manuel Castro (diretor geral do Modatex) e João Cerejeira –  professor da EEG da UMinho, cuja intervenção, com particular foco para as repercussões no setor dos aumentso do salário mínimo, será objeto de uma peça à parte a publicar na newsletter da próxima 2ª feira.

Ser diferente, surpreendendo o mercado com produtos diferenciadores, é o quarto mandamento para ser competitivo na  terceira década do século XXI. Se queremos ganhar ao Rafael Nadal seria um erro trágico aceitar jogar ténis com ele – o aconselhável é desafiá-lo para jogar à sueca, à malha ou até uma partida de matraquilhos.

Aquilo do homem e do cão afinal não é verdade 

Não é verdade que a fábrica do futuro vá apenas ter dois empregados, um homem e um cão –  o homem para alimentar o cão e o cão para impedir o homem de mexer no equipamento. O desmentido formal é de Fernando Mascarenhas, sócio da KPMG Advisory.

O número de trabalhadores ao serviço da ITV vai provavelmente reduzir-se, já que a automação e digitalização permitem a  libertação de mão de obra alocada a tarefas repetitivas. Mas vão continuar a ser necessárias pessoas – e  cada vez mais qualificadas.

“A nível dos Recursos Humanos o desafio está em atrair para a esta indústria o tipo de pessoas de que ela necessita, em competição com todos os outros setores da economia num mercado aberto e com uma oferta relativamente escassa”, alertou o sócio da KPMG.

Este não é o único desafio colocado à ITV pela indústria 4.0. Para se manterem competitivas, as empresas precisam de ser permanentemente inovadoras, quer ao nível de processos quer de produtos e mercados, o que exige investimentos caros em tecnologia pura e dura, o que coloca em cima da mesa a questão do acesso ao financiamento. 

“Os ciclos são cada vez mais curtos, os graus de disrupção superiores e cada vez mais frequentes, o que exigirá uma agilidade e flexibilidade  só ao alcance de empresas pequenas, o que pode ser uma oportunidade para uma ITV como a portuguesa constituída no seu essencial por PME”, afirmou Francisco Mascarenhas.

Prova cega: Turco português passa com distinção

João Almeida, administrador da JF Almeida, trouxe ao debate uma boa notícia sobre a qualidade dos nossos produtos, resultante de uma prova cega. Pegou em dois turcos, um paquistanês e um português, com exatamente o mesmo desenho e cor, e colocou-os à disposição de uma série de pessoas – ninguém teve dúvidas em eleger como o melhor o made in Moreira de Cónegos.

A qualidade é um trunfo, mas não chega para ser competitivo – palavra que não é uma das preferidas de João Almeida, um ex-andebolista várias vezes campeão regional e que integra a direção do FC Vizela, onde se ocupa do pelouro financeiro (“É muito mais difícil gerir uma têxtil lar do que um clube de futebol”, confessa).

“Em vez de dizer que somos competitivos, prefiro dizer que somos diferentes, apresentamos produtos inovadores, criativos, com design e credivelmente sustentáveis”, explica João Almeida, gestor de uma empresa que já pratica a recomendação saída do Forum de apostar cada vez mais na internacionalização e na exportação para mercados extra-comunitários.

“Temos uma empresa na Argélia, os Estados Unidos são o nosso grande mercado e na semana passada o meu pai esteve no Paraguai e o meu irmão no Uruguai, integrado numa missão do Guimarães Marca”, contou o administrador têxtil lar de Moreira de Cónegos.

A duríssima batalha de captar jovens

José Manuel Castro, diretor geral do Modatex e professor universitário de Psicologia, lamenta que a flexibilidade ainda não tenha chegado ao ecossistema nacional de formação e qualificação de recursos. Há uma tensão permanente entre as necessidades das empresas e os formatos pre-fabricados com regras rígidas de uma instituição pública.

“Posso ter nove pessoas a receber uma formação específica e a garantia de que elas vão ter emprego mal a acabem mas não posso arrancar com um curso se não reunir um mínimo de 15 formandos”, lamenta José Manuel Castro.

O diretor geral do Modatex acha que conjugamos em excesso o verbo aprender, preferindo falar em “criar ambientes de aprendizagem favoráveis”  – “ninguém aprende sozinho no deserto” – e em movimento.

“Captar jovens é uma batalha duríssima”, afirmou José Manuel Castro, que tem a seu cargo a tarefa, também duríssima, de dirigir um organismo que tem de envolver as empresas e articular as suas necessidades com as regras estabelecidas no Terreiro do Paço.    

Contra o greenwashing, ser credivelmente sustentável

As mesmas palavras e conceitos terem significados diversos para diferentes pessoas é o pão nosso de cada dia.  Por isso, Lurdes Brandão, auditora da SGS Portugal especializada nas questões da sustentabilidade, achou por bem clarificar o conceito de economia circular.

“Tenho a certeza que se perguntasse a cada uma das pessoas presente nesta sala qual é a primeira palavra que lhe vem à cabeça quando lhe falam em economia circular, 60% a 70% responderiam reciclagem. Ora no Plano de Desenvolvimento Estratégico para a Economia Circular, a reciclagem aparece em último lugar, bem atrás de outras prioridades, como o re-uso e a redução”, explicou Lurdes Brandão, uma engenheira ambiental que sabe do que fala, até porque é responsável pela atribuição da Cradle to Cradle, que certifica as boas práticas da circularidade dos processos de uma organização.

Não há nada mais na moda do que declarar-se sustentável e fazer juras de comprometimento com o ambiente, mas, como alertou Lurdes Brandão, não podemos a dizer que somos verdes quando na verdade somos mais negros que a carpete de cor antracite que cobre o chão do palco do auditório do CITEVE onde decorreu o fórum.        

“As empresas devem incorporar na sua prática diária os princípios da responsabilidade social e ambiental de uma forma credível e certificada”, rematou a auditora da SGS. Num momento em que há quem venda gato por lebre e está em crescimento o recurso ao greenwashing, a diferença estará em ser credivelmente sustentável e transparente, disponibilizando ao consumidor a rastreabilide completa na cadeia de valor.

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