07 outubro 25
Colaboração

Bebiana Rocha

Projeto GEMMA transforma o Bordado de Guimarães em joia

A plataforma Guimarães Marca, o Centro de Formação CINDOR e a AORP desenvolveram um projeto conjunto para transformar o tradicional Bordado de Guimarães em joia. Batizado de GEMMA, o projeto pretende recriar o bordado típico da cidade em peças de ourivesaria, simbolizando a união entre o têxtil e a ourivesaria.

“O projeto GEMMA reforça a ligação ao território e torna-se um elo entre a tradição, os criadores, as empresas e a cidade, promovendo o talento e a excelência de Guimarães no panorama nacional e internacional”, destacou o Centro de Formação Profissional de Ourivesaria e Relojoaria (CINDOR).

Durante a conversa com o T Jornal, Eunice Neves, diretora executiva, sublinha que o projeto é especial sob vários pontos de vista. “Acima de tudo, simboliza o posicionamento do município em relação a uma indústria que é cada vez mais relevante na região e no país, e que desta forma acaba por ter um holofote”, afirma.

A responsável recorda a participação na Portojoia, onde o Município esteve presente com um stand alusivo ao brilho da prata, exibindo um mostruário com 12 peças – duas por cada empresa envolvida.

“É muito giro perceber como entidades diferentes, com a mesma base, acabaram por produzir peças que se complementam, mas são diferentes entre si”, comenta. O CINDOR apresentou um conjunto de brincos e pendente em prata, cuja criação implicou um profundo trabalho de interpretação.

“O maior desafio foi mergulhar no Bordado e fazer a interpretação do mesmo. As características de um fio não são as mesmas de uma liga metálica, desde logo ao nível da densidade e do brilho”, explica.

Eunice Neves acrescenta que a inspiração partiu da abertura dos ilhós de recorte, conhecida como rolinho, uma das técnicas típicas do bordado. “No Bordado de Guimarães as combinações decorativas resultam da conjugação de 21 pontos. Foi um bocadinho essa base que seguimos, depois fomos estilizando.”

A diretora destaca ainda o papel determinante da tecnologia na materialização da proposta, nomeadamente o desenho 3D, a renderização e o corte a laser. “No passado era possível, mas nunca com este nível de detalhe, exatidão e harmonia. O desafio é muito de engenharia — a peça tem de resultar em dimensão, não pode rodar sobre si.”

A intenção, acrescenta, foi criar uma peça com modernidade, mas que contrastasse com o espírito tradicional do bordado. “Adorava que este fosse o ponto zero para outras divulgações do projeto. Mostro-me muito satisfeita com este dar as mãos entre diferentes atores e áreas, sobretudo entre setores não tão óbvia. A ativação de sinergias é muito importante.”

Também João Faria, Presidente da AORP – Associação de Ourivesaria e Relojoaria de Portugal, entidade parceira do projeto, destacou o carácter inédito da iniciativa: “Foi a primeira vez que os industriais se juntaram para ligar o que é a história da cidade à área da joalharia. Foi um pontapé de saída para a escola que vai abrir e para dinamizar o cluster de Guimarães.”

O dirigente acredita que o GEMMA não ficará limitado a esta ação nem ao setor: “Serão feitas outras aparições. As empresas de Guimarães são muito fortes na internacionalização e na tecnologia”.

joalharia com bordado guimaraes 960

Também Marta Mota Prego, em representação da plataforma Guimarães Marca, recorda que o projeto esteve recentemente exposto no stand do município na Portojoia, reforçando o seu papel na promoção do território. “O objetivo foi posicionar o setor da joalharia como um cluster exportador e tecnologicamente avançado, ao mesmo tempo que apresentávamos o novo polo do CINDOR e materializávamos os vários anos de parceria.”

A escolha do Bordado de Guimarães como inspiração foi, segundo Marta Mota Prego, natural e identitária: “Tínhamos de ter um elemento comum e que fosse identitário. O Bordado tem uma preponderância enorme na identidade local.”

A responsável lembra ainda que está em curso uma candidatura para potenciar o alcance do Bordado de Guimarães, atualmente gerida pela Oficina, empresa municipal dedicada à cultura.

A Farilu, empresa que João Faria também representa, desenvolveu também ela uma peça inspirada no Bordado de Guimarães. Para abraçar o desafio, o 3D foi mais uma vez decisivo, permitindo transformar o metal numa espécie de corda e ponto cruz.

“O 3D hoje permite fazer quase tudo. Conseguimos replicar de forma clara o ponto cruz e o bordado de alto relevo, em que fios entrelaçados na mesma direção criam uma textura e dão volume à peça”, explica.

A inspiração veio de casa: “Tinha em casa peças bordadas pela minha mãe. A nossa inspiração foi uma toalha de tabuleiro redonda, simétrica, com circunferências que aumentavam. Trabalhámos num tamanho acima do habitual para criar uma peça com impacto.” A empresa desenvolveu uma joia com volume, seguindo os motivos florais e a simetria que caracterizam o Bordado de Guimarães.

O Bordado de Guimarães, influenciado pelo Bordado Rico difundido no século XIX, caracteriza-se pela especificidade dos pontos, pela composição dos motivos e pela utilização monocromática das cores. Predominam fios de algodão mercerizado, perlé 8, aplicados sobre tecidos de linho, podendo também ser meio linho, algodão ou seda. Entre os motivos mais frequentes encontram-se folhas, flores, grinaldas, corações, silvas, figuras geométricas e algumas aves, sendo as cores mais comuns vermelho, azul, bege, cinza, branco e preto.

O bordado distingue-se pelo uso de 21 pontos, alguns destinados a delinear os desenhos – como ponto de pé-de-flor, cadeia e formiga – e outros a preencher – como cheio, canutilho, nozinho e veludo. Segundo o estudo científico Bordado de Guimarães. Renovar a Tradição (2006), da Oficina, a gradinha e o ponto de canutilho foram decisivos para a originalidade e singularidade do bordado. Desde 2010, o Bordado de Guimarães conta com certificação oficial, garantindo a preservação da técnica e a autenticidade das peças produzidas.

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