Bebiana Rocha
A The Textile Institute World Conference, organizada pela Aquitex, termina hoje, após três dias de intensa partilha de conhecimento sobre a indústria têxtil. Um dos momentos mais marcantes ocorreu ontem, com um painel que reuniu Samuel Costa (Sonix), Elsa Parente (Positive Materials), Tércio Pinto (Impetus), Albertina Reis (Riopele) e Miguel Domingues (ATB), para discutir os desafios, as oportunidades e o know-how da indústria têxtil portuguesa, ilustrando de forma prática o conceito de Cluster utilizado pelo setor para se promover.
Samuel Costa abriu o debate destacando que o maior desafio atualmente é manter a competitividade num mercado global que não segue as mesmas regras, referindo-se ao dumping asiático e à necessidade de combater esta concorrência desleal. Sublinhou ainda que a individualidade das empresas, muitas vezes isoladas, compromete a escala e o potencial coletivo do setor.
Elsa Parente, da Positive Materials, complementou que o grande desafio das empresas é conseguir preços competitivos sem comprometer a qualidade e o investimento em sustentabilidade, sendo cada vez mais difícil atrair marcas num mercado exigente.
Já Tércio Pinto, da Impetus, salientou que Portugal é considerado na Europa “o último cluster”, defendendo uma maior colaboração entre empresas, que traria vantagens competitivas, mas exigiria uma mudança de mentalidade.
Albertina Reis, da Riopele, reforçou que o mercado procura o melhor preço, mas sem abrir mão da sustentabilidade e da criatividade. Alertou para a importância de proteger o know-how das pessoas, investir no talento jovem e assegurar que haja sempre profissionais experientes para transmitir conhecimento, lembrando que as pessoas são a chave para tornar a indústria mais competitiva.
Miguel Domingues, da ATB, sublinhou que recursos humanos e talento são fundamentais para manter a posição do setor têxtil português. “Se não tivermos talento, não conseguimos manter a nossa posição”, disse, defendendo o investimento em pessoas jovens e digitais, bem remuneradas, para garantir a sustentabilidade e inovação da fileira.
No debate sobre como transformar desafios em oportunidades, os participantes destacaram exemplos concretos de ação e inovação. Miguel Domingues apontou a parceria como forma de entregar produtos de alto valor, em vez de focar apenas no primeiro preço, lembrando que institutos como o CeNTI podem ajudar na criação de produtos mais complexos e com maior valor acrescentado.
Albertina Reis reforçou que a sustentabilidade não se resume aos materiais, abrangendo todos os processos, e citou exemplos da Riopele, como caldeira de biomassa, painéis solares e exploração de materiais reciclados, mostrando como é possível conciliar inovação, redução de impacto ambiental e preparação para exigências futuras.
Elsa Parente acrescentou que a sustentabilidade também está nos processos de tingimento e acabamento, que têm impacto direto no LCA (Life Cycle Assessment) das peças. Tércio Pinto trouxe à discussão a digitalização, essencial para rastreabilidade, colaboração e responsabilidade das empresas.
Para ele, a automatização ajuda a reduzir custos e colmatar a falta de mão de obra, mas exige que marcas e indústria compartilhem investimentos e riscos. Samuel Costa reforçou que automatização não significa apenas substituição de pessoas por robôs, mas otimização de processos e redução de tarefas repetitivas, destacando ainda a importância da educação e do contacto com os jovens para mostrar as oportunidades reais da indústria.
O painel terminou com reflexões sobre a desconexão entre marcas e indústria, a valorização do talento jovem e a criação de mais oportunidades de contacto com a produção real, para que os jovens compreendam todo o processo por trás de uma peça de vestuário.
No encerramento, Jorge Faria, sócio-gerente da Aquitex, agradeceu aos participantes e destacou a primeira tentativa de aproximar academia e clientes, elogiando a capacidade de reinvenção, a visão estratégica e a abertura para inovação demonstradas por todos. “Todos estão um passo à frente e têm feito um trabalho extraordinário para a indústria têxtil portuguesa”, concluiu.