Bebiana Rocha
Isabel Furtado, CEO da TMG Automotive, foi distinguida na passada segunda-feira, 15 de dezembro, com o título de Doutora Honoris Causa pelo ISCTE. Em entrevista ao T Jornal, a empresária sublinha que esta atribuição representa o reconhecimento de um percurso profissional dedicado à indústria, ao conhecimento aplicado e à criação de valor económico e social. “É possível fazer indústria de excelência a partir de Portugal, com impacto global”, sintetiza.
Este reconhecimento reflete nas suas palavras o papel crescente da indústria têxtil portuguesa – moderna, tecnológica, inovadora e internacional. “Vindo do ISCTE, uma instituição com forte ligação à gestão, à economia e às organizações, este doutoramento valoriza a indústria como espaço legítimo de pensamento estratégico, inovação e impacto. É o reconhecimento de um sector que soube transformar-se, investir em conhecimento e competir pela diferenciação, pelo valor, e não pelo custo. Portugal distingue-se por ter um verdadeiro cluster têxtil concentrado numa área relativamente pequena, sendo atualmente único na Europa”, afirma.
Destaca que a indústria têxtil nacional se distingue pela combinação rara entre saber-fazer industrial, capacidade tecnológica, flexibilidade produtiva e aposta em inovação e sustentabilidade. “Temos empresas que dominam todo o sector – do desenvolvimento de materiais avançados à industrialização – com proximidade ao cliente, rapidez e qualidade, integradas nas cadeias de valor globais mais exigentes”, reforça.
Ao longo de 41 anos de carreira, Isabel Furtado revela ter aprendido com universidades, indústria, pessoas, mercado, erros e, acima de tudo, com a exigência de tomar decisões em ambientes complexos e em constante mudança. “Hoje, a mudança é a única constante da qual temos certeza”, afirma, acrescentando que gerir não é ter todas as respostas, mas saber fazer as perguntas certas.
A sua visão de longo prazo em contextos voláteis assenta em quatro palavras-chave: estratégia, disciplina, audácia e muita resiliência. “Na ITV e na TMG, o longo prazo é assegurado através de investimento contínuo em inovação, talento e capacidade industrial, mesmo em contextos adversos. É essa coerência estratégica que permite resistir à volatilidade sem comprometer o futuro”, explica.
Representando a terceira geração da empresa familiar – o Grupo Têxtil Manuel Gonçalves – Isabel Furtado cresceu também com a consciência de que o legado não é um privilégio, mas uma responsabilidade permanente. “Nenhuma empresa sobrevive por inércia. As empresas familiares enfrentam o desafio de perpetuar um legado, respeitando a história sem se tornarem prisioneiras dela”, sublinhou no seu discurso, lembrando que a estratégia deve passar pela evolução, transformação e adaptação.
A transformação da TMG Automotive tem sido marcada por uma forte aposta em inovação, especialização tecnológica e internacionalização, num sector altamente exigente. Sobre a cultura de inovação, Isabel Furtado sublinha que esta deve ser construída com visão de longo prazo, investimento consistente em I&D e uma cultura que valoriza conhecimento e colaboração.
“Na TMG, a inovação faz parte do dia a dia industrial, não está confinada a um departamento – nasce da proximidade entre engenharia, produção, clientes e parceiros científicos. A relação academia/empresa é fundamental para transformar tendências globais em produtos industriais”, explica, reforçando que a excelência constrói-se diariamente com inovação, engenharia, processos e, sobretudo, com pessoas qualificadas, comprometidas e motivadas.
Neste contexto, a TMG Automotive detém atualmente mais de 110 patentes registadas e está entre as cinco empresas nacionais com maior número de pedidos de patente, com mais de 140 solicitações.
“Produzimos materiais avançados e soluções funcionais e sustentáveis com propriedade intelectual própria. Isso muda o posicionamento do sector nas cadeias de valor globais. Hoje, inovação e capacidade produtiva são indissociáveis”, sublinha.
Isabel Furtado recorda igualmente que a indústria lhe ensinou resiliência, audácia e perseverança, enquanto o sector automóvel lhe transmitiu disciplina, rigor e a importância da antecipação.
Sobre ser mulher numa indústria tradicionalmente masculina, deixa uma nota breve no seu discurso que não fez disso uma bandeira, mas considera a inclusão e a diversidade como vantagens competitivas e condições de verdadeira sustentabilidade.
“O nosso sector é exemplar pela presença crescente de mulheres em cargos de direção. Na TMG, 50% dos colaboradores com educação superior são mulheres, e nos doutorados elas são a maioria. A diversidade de género é um fator de competitividade: equipas diversas tomam melhores decisões, inovam mais e compreendem melhor mercados globais e clientes diversos”, sublinha.
Em conclusão, Isabel Furtado afirma que “o futuro constrói-se na colaboração entre academia e indústria, entre quem estuda e quem executa, entre quem investiga e quem transforma”.
Olhando para o futuro, defende que a ligação academia-indústria deve ser mais estrutural, contínua e orientada para problemas reais, com projetos conjuntos de médio e longo prazo, mobilidade de talento e valorização do conhecimento aplicado.
Sobre sustentabilidade, afirma: “Na TMG, sustentabilidade não é um chavão, mas uma forma de estar, a única forma de viver”, reconhecendo os investimentos da ITV em descarbonização, economia circular, eficiência energética e novos materiais de baixo impacto.
“Levo comigo o compromisso de continuar a servir, aprender e contribuir”, resumindo a sua visão de liderança e dedicação ao setor industrial.