Bebiana Rocha
José Alexandre Oliveira entrou para a Riopele em 1977, embora tenha um quadro na empresa que comprova que já frequentava o recinto desde os seus cinco anos. Começou no chão de fábrica por indicação do pai, no qual permaneceu por 30 anos levado pela sua veia curiosa. Desde 2007 ocupa a presidência da empresa.
“Têm sido tempos gloriosos, devo agradecer ao meu pai que quando cá cheguei, com os meus 22/23 anos, que me incentivou a começar pelo chão de fábrica, o que foi muito bom para mim. A ideia era fazê-lo por um curto período, talvez dois ou três meses, a verdade é que fiquei apaixonado e fiquei a fazê-lo por mais de 30 anos”, diz em entrevista ao T Jornal.
“Costumo dizer que tirei o meu curso de engenharia têxtil em 30 anos. Queria saber porque é que o parafuso rodava para a direita e não para a esquerda, porque é que a fita se colava de uma maneira e não de outra”, continua, sublinhando que a verticalidade da empresa fez com que houvesse muito para explorar.
“O que o meu pai queria era que ficasse com uma noção de cada fase do processo produtivo, da fiação, tecelagem, tinturaria, acabamentos, enfim, percorri todas essas áreas, só nos últimos 20 anos é que vim para a parte comercial e administrativa”, situa.
Questionamos como são os seus dias atualmente, ao qual prontamente responde: “são maravilhosos, gosto muito do que faço”. O dia começa no gabinete por cerca de dez minutos, mas passa-se maioritariamente no piso de baixo.
“Estar no gabinete é uma tristeza”, confessa, “gosto de passar o tempo no chão de fábrica, em contacto com as pessoas, inteirar-me do pulsar da empresa. Tenho também uma ferramenta que me permite acompanhar tudo que se passa à distância de um clique. Sei o ponto da situação das encomendas, da produção, quanta energia estamos a consumir”, partilha, dizendo entre risos que chega a fazer 10 quilómetros por dia. “A minha vida é rolar pela empresa!”, profere.
Durante a conversa, José Alexandre Oliveira, faz questão de frisar que é um “presidente horizontal”. “Não sou um presidente de pirâmide, uma das forças que acho que consegui implementar na Riopele é precisamente de trabalharmos todos em equipa, das pessoas estarem todas em contacto e com acesso à informação”, diz com entusiasmo.
Ao longo de quase cinco décadas de trabalho, aponta como maior conquista a empresa continuar pujante: “A minha maior conquista é a empresa estar cá com 97 anos de idade, com todas as incertezas ao longo dos anos. Tivemos crises, situações de dificuldade, ninguém pense que foi tudo um mar de rosas”, diz.
A verdade é que a empresa de Pousada de Saramagos sempre soube dar a volta, tendo em mira tornar-se a “fábrica da Europa” e está a conseguir. Prestes a completar o centenário, a empresa tem investido forte para ficar com um parque industrial completamente novo.
José Alexandre Oliveira recorda que ao longo dos anos a fiação já foi mudada três vezes, tem também uma tecelagem nova e novas áreas de acabamento e tinturaria… “Estamos a pensar a fábrica para o futuro, para que mesmo com 100 anos, pareça uma fábrica nova, com um parque industrial novo”, confirma.
Para o ano de 2025 está previsto ficar terminado o novo centro de logística e mudados os telhados para aumentar a produção de energia fotovoltaica. “Queremos uma fábrica com menos consumo de energia, de água, com máquinas que nos permitam fazer produtos mais inovadores para atingirmos objetivos que as máquinas antigas não nos permitem. Estimamos um investimento para tudo isto de 30 milhões de euros”, quantifica.
A Riopele tem investido também em automatização e robotização, trabalhando junto dos fornecedores de máquinas para que sejam criadas soluções à medida das necessidades. “Temos dado algum do nosso know-how para que as máquinas têxteis evoluam”, dá nota.
A mesma lógica é aplicada na criação das coleções, que são agora desenvolvidas em conjunto com os clientes para que respondam às suas necessidades e expectativas. “Antigamente fazíamos coleções e íamos para as feiras vender o que criávamos, havia uma distância entre nós e o cliente. Hoje essa distância desapareceu, porque começámos a entusiasmar os clientes, a fazer com que visitassem a fábrica, nós próprios vamos visitá-los… As feiras passaram a ser meramente institucionais” enquadra. As malas já estão a ser preparadas para rumar à Milano Única e Première Vision Paris nos próximos dias.
Na sua história de vida José Alexandre Oliveira conta com passagem pelas mais importantes associações do sector têxtil e vestuário, entre as quais a ANITAF, APT, EUROCOTON e mais recentemente a EURATEX.
Em entrevista ao T Jornal, recorda a importância que Portugal tinha enquanto fiador de algodão, as imensas divisões que existiam na Associação Nacional das Indústrias Têxteis e Afins, e a força que tinham os grupos retalhistas na EURATEX.
“A EUROCOTON na altura era uma organização muito importante, porque o algodão era muito fiado na Europa. Havia muitas fiações europeias, então cá em Portugal havia uma fileira muito forte, um sector das malhas que era muito importante”, partilha. Corriam os anos 80/90 quando José Alexandre Oliveira se juntou à EUROCOTON, atualmente absorvida pela confederação EURATEX.
“Portugal era, a seguir a Itália, o segundo maior país em termos de número de fiações, por isso, fiz dois mandatos como vice-presidente e um mandato como presidente da EUROCOTON”, clarifica.
As lembranças da ANITAF surgem logo de seguida, “se hoje a ATP absorve empresas de todas as áreas, antigamente tínhamos divisões para cada uma delas. Era fiandeiros, tecelões, acabamentos, tinturaria e estamparia, os das passamanarias… estamos a falar de vários setores, que se gladeavam entre si”.
Nesta revisitação, fala ainda do tempo em que representou Portugal na EURATEX. Diz que os temas discutidos eram idênticos aos de hoje, mas mais concentrados no comércio. “A indústria e as marcas tinham interesses distintos, grandes grupos do retalho tinham um cash superior e por isso tinham um peso diferente da indústria”, concluiu.
A veia associativa levou o empresário também a aproximar-se das universidades. A Riopele esteve na fundação da Porto Business School, atualmente mantém também uma forte ligação com a Universidade do Minho, essa proximidade advém de José Alexandre Oliveira ter notado uma necessidade de cativar os jovens para a indústria.
Lembra-se de ter dado uma palestra na FEP – Faculdade de Economia da Universidade do Porto, para um auditório cheio de alunos: “falei como um apaixonado que a indústria têxtil era o futuro. Quando terminei tinha vários jovens com o braço no ar, achei que tinha dito uma asneira, mas na verdade grande parte das suas famílias, ou pais ou avós, tinham trabalhado na têxtil, tinham passado dificuldades, e diziam em casa que esta indústria era para acabar. O que respondo sempre nessas situações é que todas as indústrias podem acabar, todas as profissões podem acabar. Pode não parecer, mas continuamos a ter um peso substancial na economia, sobretudo neste raio do Vale do Ave. Se não houvesse empresas têxteis, as pequenas, as médias e as grandes, era um problema mesmo hoje”, terminou o raciocínio.
Convencermo-nos que as coisas não se fazem de um dia para o outro é o principal conselho que o Presidente da Riopele deixa aos jovens. Ao completar 70 anos de idade nesta sexta-feira, o empresário diz em entrevista ao T Jornal que não é preciso ter pressa, é preciso acreditar nas coisas e fazer tudo com amor!
“Gosto e faço tudo para ser feliz, gosto muito do que faço. Ao longo da minha vida tive sempre a sorte de aprender com pessoas que tinham muita prática e muito conhecimento”, completa com emoção na voz.
Não gosta de pessoas teimosas, nem de reuniões longas. Também não gosta de farinha de pau, “porque comia muito no colégio”, dá-se a conhecer. Nos tempos livres gosta de viajar, de ler, de comer bem e também de acompanhar o desporto. “Gostava muito de praticar desporto, fui transversal a várias atividades, desde ténis a futebol e andebol”. É uma pessoa dedicada aos outros, dedicada à empresa, na qual conta estar “até ao último dia”!