Bebiana Rocha
Imagens: Arquivo ATP
Faleceu no passado mês de setembro Fernando Barroso, que foi durante vários anos presidente da direção da APIM – Associação Portuguesa das Indústrias de Malhas, uma das entidades que esteve na génese da atual ATP – Associação Têxtil e Vestuário de Portugal. Figura central do associativismo têxtil nas décadas de 1970 e 1980, com influência ainda nos anos 90 e início de 2000, deixou uma marca profunda na modernização do setor e na consolidação das suas estruturas institucionais.
Duarte Nuno Pinto, da P&R Têxteis, recorda-o como “um dirigente que exerceu sempre os cargos com excelência, inteligência e coragem”. “Destacou-se num período muito exigente, entre 1974 e a entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia, em janeiro de 1986. Pautou sempre a sua conduta por uma liderança participativa com os seus colegas dos órgãos sociais e com um espírito de missão”, sublinha.
Duarte Nuno Pinto destaca ainda o seu papel no Instituto dos Têxteis, então pertencente à esfera do Estado, e na mudança de paradigma de uma indústria voltada sobretudo para o mercado nacional e colonial para uma lógica de internacionalização.
Participou ativamente na regulação dos contratos coletivos de trabalho com os sindicatos — “uma das primeiras missões das associações empresariais” — e teve um papel relevante na componente de formação técnica, onde também deixou o seu cunho. Foi ainda vice-presidente da Portex, entidade que acompanhou de perto.
“Era uma pessoa ética e com grande atenção à vida associativa”, acrescenta Duarte Nuno Pinto, que integrou os órgãos sociais da APIM. Com o passar dos anos e já de idade avançada, Fernando Barroso foi-se afastando da dinâmica associativa e dos seus negócios, que incluíam, entre outras empresas, A Nova Alvorada, em Fafe, ligada à área das malhas.
Paulo Vaz, ex diretor geral da ATP e que privou de perto com Fernando Barroso durante longos anos, fala de “amizade e admiração”. “Foi um importante empresário do setor têxtil. Já vinha de uma família de empresários – o pai foi uma figura muito relevante, não só na área têxtil, mas também nas conservas de peixe”, contextualiza.
Empresário com atividade em Fafe, Matosinhos e no Porto, Fernando Barroso é considerado por Paulo Vaz “o presidente mais importante que a associação das malhas já teve”. Foi também presidente da Associação Europeia das Indústrias de Malhas e responsável pela organização do Congresso Mundial da Malha, realizado em julho de 1989 — “o maior congresso de sempre da indústria têxtil no mundo”, como recorda. “Durante uma semana o norte do país transformou-se na capital da indústria têxtil, o que, na altura, era algo extraordinário”, partilha.
O seu papel foi igualmente determinante na criação de organismos que continuam hoje a ser pilares do setor, como o CITEVE, o CITEX (atual Modatex), a Exponor — cuja génese, recorda Paulo Vaz, “teve a indústria têxtil e vestuário na sua base” — e o Gabinete Portex. “Fernando Barroso foi uma figura fundamental para tornar a ITV relevante à escala europeia. O setor tem de lhe reconhecer esse mérito”, sublinha.
Já numa fase posterior, foi um dos principais responsáveis pela fusão da APT com a APIM, em 2003, que deu origem à ATP, tendo sido o primeiro presidente da Assembleia Geral da nova associação. “Esteve sempre ligado ao movimento associativo, procurando engrandecê-lo e modernizá-lo. Não foi só um grande empresário, foi uma excelente pessoa, um verdadeiro cavalheiro”, afirma Paulo Vaz.
Recorda também os momentos difíceis da sua liderança, nomeadamente durante o processo de liberalização do comércio e a aceitação do Acordo Multifibras. “Era muito considerado no meio, tinha capacidade para fazer pontes e manteve-se sempre respeitado pela indústria”, acrescenta.
Paulo Vaz entrou para a APIM com apenas 25 anos. “Com 26 fiquei responsável pela casa e com 28 assumi a direção-geral. Era muito jovem quando privei com ele. Devo-lhe muito pela maneira elegante como sempre geriu a associação. É uma pessoa que deixa saudades.”
João Costa, que também privou de perto com Fernando Barroso, destaca “o papel muito importante que desempenhou quer na APIM quer na promoção da fusão que deu origem à ATP”. “Contribuiu de forma decisiva para que o setor se afirmasse como moderno e capaz de enfrentar a concorrência. Ajudou na promoção do setor e no diálogo com o Governo”, sublinha.
Descreve-o como “uma pessoa de bom trato, com abertura, frontalidade e um discurso lúcido e convincente, numa altura em que não era fácil tomar posições”. “Estamos a falar do período pós-25 de Abril, um tempo revolucionário. Era dinâmico, colaborativo e cativante no discurso — uma qualidade essencial para as funções que desempenhava”, acrescenta.
Recorda ainda o lado empresarial, nomeadamente a sua empresa A Alvorada, ligada à tinturaria, estamparia e acabamentos de malha. “É importante que pessoas como Fernando Barroso não existam apenas na memória. Devemos documentar e deixar registo da sua relevância”, remata.