Bebiana Rocha
O auditório do CITEVE acolheu ontem o evento “Entre Linhas e Dados”, uma sessão dedicada à partilha dos desenvolvimentos do projeto Texp@ct, iniciativa que reúne empresas e entidades do setor têxtil e vestuário nacional com o objetivo de acelerar a digitalização da indústria.
Na abertura, António Braz Costa, diretor-geral do CITEVE, fez um enquadramento sobre a evolução da digitalização na última década, sublinhando a urgência da transformação tecnológica. “Chegados a 2025, amigos que ainda não tiverem presente na cabeça que a sobrevivência do sector na Europa depende de digitalizar processos, preocupa-me”, alertou. O responsável destacou ainda o impacto da inteligência artificial na indústria: “IA é uma caixa com vários pares de sapatos. Só quem nunca experimentou o Chat GPT é que não percebe as potencialidades da IA.”
E acrescentou: “Todo o mundo está em grande velocidade, e com massas maiores do que as nossas. Já lá vai o tempo em que estávamos à frente. É preciso que os resultados deste projeto cheguem às empresas. Espero que hajam apoios para ajudar as empresas neste percurso, porque não é fácil nem barato.” O diretor-geral recordou ainda que em 2020 o CITEVE decidiu criar um departamento próprio de digitalização – “um investimento que foi feito em boa hora”, disse – e deixou um agradecimento a todos os parceiros do projeto.
Seguiu-se Tércio Pinto, que destacou a importância do PRR como oportunidade de colaboração entre empresas e entidades de I&D. “O PRR foi uma grande oportunidade para todos de colaboração. A grande oportunidade para nós foi perceber que é impossível integrar a digitalização sem ser como um todo no sector. O projeto criou uma nova dinâmica, reforçou a colaboração. A transmissão dos dados assim o obriga”, afirmou.
Reconhecendo o baixo grau de digitalização de muitas empresas, sobretudo micro e pequenas, Tércio Pinto, board member do Grupo Impetus, reforçou a importância da entreajuda e da rastreabilidade da informação. “Portugal pode ser exportador de serviços, até porque algumas tecnologias já estão num nível de desenvolvimento maduro”, disse, acrescentando que “ao nível da automação temos muito para fazer. A mão de obra vai escassear, temos de ser mais eficientes.”

Um projeto de grande escala
Pedro Machado, do CITEVE, apresentou um balanço com números expressivos do Texp@ct: 39 parceiros, 650 pessoas envolvidas, 26 PPS (Produto, Processo ou Serviço) distribuídos por sete áreas temáticas, e uma equipa de gestão com 15 pessoas, responsáveis pela monitorização, relatórios e cumprimento de prazos e metas. “São elas que fazem os relatórios acontecer, que garantem que os custos estão dentro do estipulado, que fazem cumprir os temas e as deadlines”, referiu o profissional de TI, deixando um agradecimento especial a este grupo.
O projeto já contabiliza mais de 1000 reuniões de acompanhamento, 12 relatórios periódicos e mais de 110 gigabytes de documentação de suporte. Pedro Machado lembrou que “isto ainda não acabou”, apontando o trabalho que resta fazer em documentação, promoção e dossiês de comprovação até meados de 2026.
Da validação ao valor no mercado
João Oliveira, diretor do Texp@ct, destacou que o projeto entrou na reta final, sendo agora crucial “resolver a questão da propriedade intelectual e focar no valor de cada PPS – como vai chegar ao mercado e de que forma pode ser distribuído.” Sublinhou ainda que “a componente de validação em ambiente real é crucial” e que, nesta nova fase, “o objetivo já não é ver se uma determinada solução funciona, é ver o valor que ela traz para as empresas e para os seus utilizadores.”
O responsável salientou a importância de abrir as experimentações a empresas fora do consórcio, afirmando: “As empresas do consórcio seriam as early adopters, mas temos recebido pedidos de empresas externas que também querem testar. Temos de trabalhar numa forma de assegurar os direitos, mas também abrir à experimentação.”
João Oliveira defendeu ainda a necessidade de manter um sistema de inovação colaborativo, envolvendo empresas têxteis, tecnológicas e entidades de I&D: “Usar os resultados do Texp@ct como exemplo e como prova é fundamental. Este triângulo harmonioso deve manter-se de portas abertas depois do final do projeto.”

Segundo o CITEVE, foram desenvolvidas 26 soluções com um TRL (Technology Readiness Level) elevado e potencial de mercado, com foco na acessibilidade às PME. “A digitalização tem sempre a perspetiva da sustentabilidade. O contributo digital é válido para a sustentabilidade”, sublinhou João Oliveira, apelando: “Desafiem as pessoas a juntarem-se a este movimento para dar resposta a desafios cada vez maiores e com retorno.”
Antes de encerrar, o responsável anunciou um grande evento final do Texp@ct, a realizar-se a 11 de maio, na Alfândega do Porto.
Um setor com futuro
O encerramento ficou a cargo de José Polido Valente, presidente do IAPMEI, que enalteceu o espírito de cooperação e a vitalidade da indústria. “O que vi e ouvi hoje convence-me de que nada dispensa estarmos juntos e no terreno. Não há relatórios que dispensem estas ações. Esta inteligência emocional que presenciei demonstra a pujança de um sector que peca por continuar associado a um sector tradicional, quando não o é”, afirmou.
Polido Valente destacou ainda que “o STV não é um sector com mais passado que futuro, é um sector com perspetivas de negócio, de valor para o mercado.” E deixou uma mensagem de realismo e ambição: “Não haverá nunca sustentabilidade ambiental se não houver sustentabilidade financeira.”
Concluiu com uma nota inspiradora sobre o papel do país: “Portugal não é um país atrasado, não é um país periférico nem pequeno. Somos um país com talento, com competência. Com alguma sorte, vamos conseguir ser um país mais próspero.”