Rita Ribeiro
“Portugal é um cluster fortíssimo”
T60 - Janeiro 2020

António Freitas de Sousa

Rita Ribeiro está a proceder ao reposicionamento da TMG Textiles, no sentido de a colocar em linha com as profundas alterações motivadas pela pandemia. É que, diz, o consumo está a dirigir-se para outro tipo de soluções de moda e só as empresas mais bem preparadas e que souberam antecipar tendências terão a possibilidade de beneficiarem com essas alterações.

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omo é o organigrama atual do grupo TMG?

Textiles, Automotive, Energia e Retail.

Como evoluiu a sua área ao longo de 2020?

Na Textile tivemos curiosamente um 2020 em linha com 2019, mas de forma completamente diferente. Em 2019, o negócio dos tecidos era a cabeça de cartaz, com as malhas em terceiro plano e o negocio das confeções a meio. Em 2020, aconteceu o oposto: as malhas dispararam – ficando 20% acima de 2019 – nas confeções (só trabalhamos com clientes dos segmentos médio e médio-alto) não sentimos qualquer quebra: na confeção de malhas tivemos um crescimento de 10% e na confeção de tecidos de 5%. A confeção de tecidos é um negócio recente – adquirimos esta valência quando a Ricon fechou. Somos bons a tecer, somos bons a tricotar, temos bom produto de malha, bom produto de tecido. Vendemos às grandes marcas de todo o mundo, Portugal é um cluster fortíssimo.

Ao nível internacional?

O cluster têxtil é hoje uma referência a nível internacional mas podia ser muito mais se comunicássemos melhor entre nós. Somos competitivos, temos uma capacidade de trabalho acima da média, temos qualidade e o que não temos sabemos onde ir buscar. Com outra vantagem: qualquer cliente que vem a PT, tem o calçado, a moda, o automóvel. As indústrias todas existem num espaço de 200 quimómetros.

Podia portanto ser melhor?

Podíamos vender mais do que aquilo que vendemos – e falo pelo cluster. O que acontece é que hoje os clientes têm mais lacunas a nível técnico e industrial, porque o seu foco é e será  cada vez mais a comunicação ao cliente final. A comunicação passou a ser o ponto forte das marcas, e não propriamente a rede de sourcing. Fomos percebendo que nos devíamos posicionar como uma solução industrial para o cliente – deixando-lhe a parte da comunicação, do marketing e da publicidade – e tomando as competências técnicas.

Cara a cara
"Mal as feiras reabram, a TMG estará presente e sempre na linha da frente"

Qual foi a solução?

Investimos na confeção para podermos estar mais perto do cliente apresentando-lhe soluções de total look. Desta forma acabamos por ser clientes e fornecedores dos nossos parceiros de confeção, trabalhando com eles as soluções para o cliente final.

Encontraram isso tudo na Ricon?

A Ricon tinha todas as valências mas o que procurávamos era a área do outerwear pois era o que nos faltava para compor o full package porque não é uma área muito forte em Portugal. Recrutamos as melhores costureiras para esta área de produto, investimos na maquinaria adequada e assim nasceu a MGLab, uma confeção que em conjunto com a verticalidade TMG oferece as melhores soluções aos seus clientes. É isto que temos hoje: a confeção de tecidos, a confeção de malhas, o negócio de tecidos e o negócio de malhas (venda a metro).

Voltando aos números de 2020…

Na venda de tecido a metro, tivemos uma quebra de cerca de 15%. Com os 15% a mais das malhas, ficámos em linha com os números de 2019. São números que, embora não sejam preocupantes, fazem de 2020 um ano completamente atípico: estávamos cheios de encomendas quando começámos a perceber que Espanha e Itália estavam a pedir para as colocar em stand by. Não chegámos a ter cancelamento de encomendas – mas o que é certo é que tanto nós como clientes estávamos um pouco à espera que esta pandemia passasse mais rápido do que está a acontecer e claro que estamos um pouco receosos.

"Somos bons a tecer, somos bons a tricotar, temos bom produto de malha, bom produto de tecido. Vendemos às grandes marcas de todo o mundo, Portugal é um cluster fortíssimo"

Motivados pelo quê?

Eu não tinha a menor dúvida que o produto que tinha em stock desde março era para colocar em loja em setembro. Se a pandemia continua, pode ser crítico. Não abana a TMG, mas abana a operação. O que é que foi atípico? Durante dois anos e meio, vivemos com encomendas de projetos novos, negócios novos, coisas novas a aparecerem. Nunca parámos para perceber que o negócio têxtil pode ser muito complicado. É um negócio difícil, de momentos – com sazonalidade, com muitas variáveis. O mês de abril, com um pico de encomendas em malhas, com as confeções a funcionarem em pleno, vimos os tecidos a pararem. Os tecidos sempre foram o coração do têxtil. Faturamos uma média de 30 milhões – onde 20 milhões são o negócio dos tecidos e o resto (malhas e confeções) eram 10 milhões. Isto está a inverter-se – está a ficar meio-meio.

Na sua perspetiva, a moda vai ser uma coisa completamente diferente?

Não tenho a menor dúvida.

Como é que na TMG estão a preparar-se para essas alterações?

Foi um dos desafios de 2020. A TMG Textiles hoje abraça 3 áreas de negócio, têxteis para a moda, têxteis para automotive e têxteis de proteção (workwear e corporate wear). Cada uma destas 3 áreas de negócio tem 5 polos indústrias que as abastecem (tricotagem, tecelagem, acabamentos, confeção de malhas e de tecidos) e um conjunto de parceiros cada vez mais forte.  É esta matriz alinhada com uma estrutura de RH altamente qualificada que está em funcionamento e que acreditamos ser o futuro.

Convergem os dois lados do negócio?

Sim, toda a gente está consciente e convicta que vai acontecer.

O automóvel?

Temos que separar o Automóvel em dois. TMG Automotive é um negócio do qual Textiles não tem qualquer interveniência e outro são os Texteis para Automotive que é a área de negócio que arrancou em 2020. É um projeto altamente desafiante onde trabalhamos quer com TMG Automotive que tem sido o nosso grande aliado, como com clientes externos.

Estão a preparar o regresso à normalidade. As feiras fazem parte dessa estratégia?

Mal as feiras reabram, a TMG estará presente e sempre na linha da frente. Mas vamos estar de forma diferente. Não tem nada a ver com mais ou menos área de exposição, tem a ver com a forma como vamos apresentar o nosso produto – área onde já demos um salto muito grande. Este ano, como não há feiras físicas estamos a apostar no online e para além disso estamos a antecipar a produção da coleção. Já estamos a promover SS22. Por outro lado, reestruturamos a nossa equipa de agentes e felizmente hoje estamos muito bem representados em cada pais.

Fundamentais durante a pandemia?

Durante o ano de 2020, os agentos foram pessoas fundamentais, porque passaram a ser os ‘locais’ da TMG. Tínhamos uma TMG em cada capital europeia, o que fez com que o nosso produto fosse divulgado na mesma. O facto de termos um relacionamento estreito com os nossos principais clientes também permitiu que as equipas de desenvolvimento e comercial continuassem a trabalhar. Fizemos várias coleções por TEAMS, a ferramenta mais usada pela na TMG no último ano.

Em termos do volume de negócios, o que é que cada uma das quatro áreas de negócio vale para o todo?

O Textiles representa cerca de 30 milhões de euros, Automotive  120 milhões, Retail  3 milhões e a Energia cerca de 1 milhão de euros.

O acionista está satisfeito com o resultado?

Embora o acionista seja altamente exigente, creio que estamos a conseguir que esteja satisfeito. Trabalhamos sobre 3 vetores para atingir o resultado esperado, RH, Fornecedores e Clientes e esta trilogia está a funcionar. É uma cadeia, que só funciona se todas as partes estiverem felizes e é esta cadeia a funcionar que permite o mundo girar.

Perfil

Fundado em 1937, o grupo Têxtil Manuel Gonçalves (TMG) tem sido um dos líderes de um setor que passou por uma série de alterações de grande impacto nas últimas décadas. A sua aposta nos têxteis especializados e a remoção do seu portefólio de segmentos que deixaram por diversas razões de serem competitivos revelou-se uma estratégia vencedora. De empresa tradicional, a TMG soube encontrar um lugar de destaque ao nível dos têxteis técnicos – o que fez com que a TMG Automotive passasse a ser o ‘porta aviões’ do grupo. Sabendo disso, a a TMG Textiles aliou-se à ‘irmã mais velha’ para beneficiar da sua exposição a um mercado que está na linha da frente da produção com grande valor-acrescentado, enorme capacidade de geração de expotações e margens de negócio aliciantes. Mas esse é apenas um dos lados do reposicionamento da TMG Textiles. O outro, passou pela identificação do que será o mundo do consumo pós-pandemia. Por muito difícil que seja definir quando chegará esse mundo – talvez no segundo trimestre deste ano – importa perceber o que vai mudar e direcionar a empresa para usufruir dessas alterações. Para isso, e entre outras questões igualmente acauteladas pela equipa de Rita Ribeiro, a Textiles está à espera de poder regressar quanto antes às feiras internacionais – uma aposta antiga que em muito contribuiu para colocar o grupo no topo das empresas portuguesas que lideram as exportações. E é exatamente no exterior que o grupo nacional se tem destacado, como o prova o facto de, há pouco mais de um ano, a MGC, joint venture criada em junho de 2017 entre a Carrington Textiles, sediada no Reino Unido, e a TMG, terem compraram o grupo alemão Melchior Textil GmbH.

As perguntas de
Rita Fernandes
Administradora da Mundifios

De que forma a pandemia afetou a vossa parte industrial?

A pandemia veio obrigar-nos a parar para pensar o futuro. Com  esta nova visão estamos a reforçar áreas que estavam adormecidas, nomeadamente o setor de malhas onde crescemos em 2020. Por outro lado estamos a reestruturar a nível de produto a área de tecidos nunca perdendo a nossa identidade.

Considera a digitalização um fator fundamental para o futuro da Indústria Têxtil Portuguesa?

Sem dúvida. A indústria está a sofrer um processo de transformação cada vez mais voltado para series mais pequenas, uma maior variedade de produtos, timings mais curtos e uma exigência de sustentabilidade no ciclo de vida do produto, o que faz com que tenhamos que aproximar, processos produtivos e processos de informação e comunicação num sistema único.

Luis Cristino
CEO Hindu Technical Textiles S.A.

Tendo criado o MG Lab e o Centro de Competências, que mais-valias e novos mercados atraiu para o universo TMG?

A TMG posicionou-se como  solução criativa e industrial para a marca. Connosco conseguem trabalhar desde o desenvolvimento do fio até á peça final.

De que forma se alargaram as fronteiras da TMG com a política de parcerias que tem vindo a estabelecer?

Conseguimos com os nossos parceiros alavancar negócios que devido ás limitações internas anteriormente não era possível.

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