9 janeiro 2019
Heimtextil

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É oficial! Made in Portugal é curriculum e não cadastro

É oficial. O Made in Portugal deixou definitivamente de ser cadastro para passar a ser curriculum. Esta declaração oficial podia perfeitamente ter sido formalizada durante a visita do secretário de Estado da Internacionalização aos expositores portugueses presentes na Heimtextil, a maior feira mundial de têxteis lar, que decorre até 6ª feira na Messe Frankfurt.

“É uma mudança substantiva que não podemos negligenciar. Lembro-me perfeitamente que há coisa de dez anos, quando era administrador do ICEP, das empresas  portuguesas preferirem usar a etiqueta Made in European Union para esconder a denominação de origem nacional”, recordou Eurico Brilhante Dias.

“Todos os meus clientes norte-americanos exigem que eu ponha em lugar de destaque o Made in Portugal, não só nas etiquetas mas também nas embalagens”, contou Miguel Chareca, administrador da Newplaids, uma têxtil lar de Mira de Aire, especializada em mantas e capas para almofadas, que emprega 120 trabalhadores e faz um volume de negócios na ordem dos quatro milhões de euros, quase exclusivamente no mercado externo.

“Exportámos para todo o lado. Só não vendemos para Portugal”, exagerou Chareca, que fez uma pausa numa reunião com a sua agente na Suécia para receber os membros do governo. Brilhante Dias foi rápido na resposta: “Como secretário de Estado da Internacionalização não me queixo de só vender para fora, mas aqui o meu colega da Economia ja não sei…”

João Correia das Neves, secretário de Estado da Economia, Eurico Brilhante Dias e João Gomes, o nosso embaixador em Berlim, passaram o dia de ontem na Heimtextil, distribuindo palavras de encorajamento e inteirando-se do momento em que vivem as 82 empresas portuguesas que estão a expor em Frankfurt.

O facto de o Made in Portugal ter deixado de tirar valor, muito antes pelo contrário, foi uma conclusão consensual. “O peso positivo da marca Portugal é crescente”, garantiu Helena Correia, do Departamento Comercial da Giestal. Já o mesmo não se poderá dizer sobre a maneira como correu o ano de 2018 e as perspetivas quanto ao futuro.

Os secretários de Estado ouviram histórias de encantar, como a da Marizé – “Esta é a primeira feira que fazemos, em absoluto, e hoje de manhã já temos negócios bem encaminhados com clientes da China e do Canadá”, contou João Pedro Monteiro, diretor comercial desta têxtil lar, que vende 8,5 milhões e tem os Estados Unidos como principal mercado. Ou a da Nosdil, onde a afogueada Ana Brites, do Departamento de Exportação, confidenciou aos secretários de Estado: Hoje ainda não parei um segundo”. “Então vamos já embora para a deixar trabalhar”, respondeu-lhe, meio a brincar (mas também meio a sério)  Eurico Brilhante Dias.

Mas os secretários de Estado também levaram para Lisboa relatos de dificuldades, de momentos menos bons, bem como das incertezas que se perfilam no horizonte de uma indústria que cresce há nove anos consecutivos.

“Temos uma grande dificuldade em crescer, não por falta de encomendas, mas por falta de capacidade de produção. É dramática a escassez de mão de obra que afeta áreas como a tecelagem e a confecção”, chamou a atenção Paulo Coelho Lima, administrador da Lameirinho.

“Crescemos muito no ano passado. De 43 milhões de euros em 2017 para 53 milhões em 2018, muito por impacto de uma grande encomenda extraordinária de 15 milhões de euros para Itália”, informou Joaquim Almeida, CEO da JF Almeida, antes de se queixar amargamente de como a nossa competitividade está a ser afetada pelos aumentos escandalosos do preço da água.

“Além do custo exagerado da energia temos de suportar aumentos inexplicáveis do preço da água. A inflação andou nos 1%, mas o preço do metro cúbico de água aumentou mais de 7%”, lamentou o responsável pela têxtil lar de Moreira de Cónegos.

“Ninguém sabe ao certo o caminho que isto vai tomar. Há uma grande incerteza no ar. Os mercados estão muito instáveis. A primeira metade do ano passado foi fabulosa, mas o 2º semestre foi muito mau. O consumo está a cair. As pessoas têm pouco dinheiro no bolso”, lamentou Carlos Gonçalves, administrador da BomDia, que fechou 2018 com uma quebra de 4% nas vendas, muito por culpa da diminuição das vendas para Espanha.

Curiosamente, para a Home Flavours, o ano de 2018 correu exatamente ao contrário do que na BomDia. “O primeiro semestre foi mau, mas o segundo correu tão bem acabou por compensar”, afirmou Cristina Machado, administradora da empresa, que está preocupada com as consequências do Brexit não só nas vendas para o Reino Unido mas também no resto da Europa.

“Estou a ver as coisas muito calmas …”, acrescentou Cristina, usando palavras prudentes que contrastam com o otimismo de António Leite, administrador da Lumatex: “Estou com boas expectativas. 2019 tem de ser melhor que 2018”.

O consenso volta quando se fala da nova distribuição das empresas pelos pavilhões, que acompanhou a inauguração do Hall 12, que acrescentou mais 33 600 metros quadrados de área de exposição à Messe Frankfurt. Todas as vozes que se levantaram estão contra a nova arrumação.

Até esta edição da Heimtextil, o pavilhão 11 reunia a nata dos expositores mundiais – e naturalmente a presença portuguesa era aí dominante. Agora, os pesos pesados da têxtil lar nacional foram desterrados para um pavilhão com corredores estreitos, espaços acanhados, onde convivem com concorrentes turcos de qualidade inferior, num ambiente que lembra uma festa onde há gente de smoking e outros descontraidamente vestidos com t shirt, calções e havaianas.

“Não tem jeito nenhum terem-nos posto ao lado dos turcos e do AICEP do Egipto. Fizemos um enorme investimento em área e no stand, que acaba por não sobressair no meio desta confusão. Isto está horrível”, lamentou Ana Vaz Pinheiro, administradora do Mundotêxtil.

Artur Soutinho, CEO do grupo MoreTextile, faz coro com as criticas de Ana: “Está tudo muito apertado. Uma desgraça. Devíamos ter mais espaço para os stands poderem respirar”. A haver um moral nesta história, a Messe Frankfurt terá muito provavelmente de fazer marcha atrás neste movimento, se quiser manter o nível investimento feito na Heimtextil pelas têxteis lar portuguesas.

             

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