T37 Novembro 18
Dois cafés & a conta

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A irmã convenceu-a
“Telefonou-me a dizer que eu tinha de ir ao concurso, que era burra porque trabalhava de graça”
Uma nova carreira
Depois de ter vencido o "Cosido à Mão", Carla abriu um atelier e prepara-se para lançar uma colecção de moda infantil
Carla Costa

A vencedora do concurso da RTP "Cosido à Mão" é uma costureira irrequieta que admite nunca estar satisfeita: "Quero sempre mais. Independentemente do que fazemos, temos o saber fazer muito bem, para sermos diferentes e melhores que os outros” declara.

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lém de ter a virtude de fazer-nos saber o que Carla sabe fazer muito bem (alta costura), o Cosido à Mão teve o mérito de ser o gatilho para um segundo fôlego à carreira da vencedora do concurso da RTP 1, que abriu um atelier em Guimarães e se prepara para lançar na primavera uma coleção de criança que levará o seu nome na etiqueta.

“Nunca estou satisfeita. Quero sempre mais. Independentemente do que fazemos, temos o saber fazer muito bem, para sermos diferentes e melhores que os outros”, declara esta costureira irrequieta, que almoçou connosco em Paris na Première Vision, onde estava a usufruir do prémio do T para a vencedora do concurso.

“Ando a tentar fugir da carne”, diz Carla, explicando a opção por uma salada num restaurante de bifes – e acrescentando estar deslumbrada com os tecidos que vira durante a manhã.

“Ganhar o Cosido à Mão abriu-me portas para comprar materiais espetaculares, que dantes não conseguia arranjar. E além de ter mais trabalho, o principal é que agora me pagam melhor”, conta Carla, que assim dá razão à irmã Rosa Maria, que é debuxadora e a empurrou para o concurso.

“Telefonou-me a dizer que me ia inscrever, que eu tinha de ir ao concurso, que era burra porque não me valorizava e trabalhava de graça”, recorda. Não trabalhava de borla, mas quase.

Após três anos de aprendizagem na Triamitex, Carla juntou-se a uma colega da confeção, compraram umas máquinas e começaram a trabalhar em casa, por conta própria. “Havia muito trabalho a feitio”, diz.

Aos 21 anos casou-se com Ricardo, o primeiro e único namorado, um electricista tão dragão como ela (passaram a lua de mel em Génova, para verem o Porto disputar com a Sampdoria os quartos de final da Taça das Taças), que no entretanto se estabeleceu com uma empresa de material elétrico. E quando começaram a aparecer os filhos, não deixou de trabalhar, mas a mãe tinha sempre prioridade sobre a costureira.

À medida que os filhos cresciam, sobrava cada vez mais tempo para a costureira que se entretinha a fazer arranjos para lojas de marca, “não de graça, mas a preço de saldo”, pelo prazer de poder virar do avesso os vestidos e os casacos – e assim aprender as técnicas usadas pelas marcas famosas.

“Eu estava a voltar a ter tempo quando apareceu o programa”, explica. Pressionada pela irmã, falou ao marido, que lhe deu luz verde (“Para mim tudo quanto tu fizeres está bem feito”). Foi a primeira vez que passou um mês fora da família. “Acabou por ser bom. Eles estavam muito agarrados a mim. Aprenderam a viver sozinhos. A desenrascarem-se”. Mas foi duro. “A mim custou-me muito. Levantava-me às 4h30 e trabalhava até à noite. Sábado vinha a casa mas voltava logo no domingo”. Mas, como se provou, ele tinha capacidade e energia para isso e muito mais.

Agora, pensa as linhas com que se vai coser o seu futuro. Confessa que não ter qualquer mal entendido com a vida. “Adoro ser costureira”. E não consegue perceber a mentalidade das miúdas novas que preferem estar numa loja a aturar toda a gente, a ganhar o salário mínimo e a trabalhar aos fins de semana, a aprender uma arte tão bonita como a dela.

Perfil

Tinha seis anos quando, de repente, no regresso de férias, ficou órfã de pai, presumivelmente vítima de doença contraída na guerra, em África. Foi criada em Ribeirão por uma ama que era costureira e apesar de ter oito filhos ainda arranjou tempo e cabeça para tomar conta dela e de Sandra, sua irmã mais nova. Mudou-se para Guimarães, onde a mãe recompôs a vida após três anos de viuvez. Deu por terminados os estudos escolares no final do 6º ano. “Tinha de ir trabalhar”, explica. Debutou com 14 anos, numa empresa de malhas, a Triamitex, onde aproveitava a hora do almoço para se aperfeiçoar na arte da costura. Tinha 15 anos quando conheceu o marido, Ricardo, no autocarro (ela ia trabalhar e ele ia estudar, para a Escola Industrial) e nunca mais se largaram. “Cada vez gosto mais dele”, confessa Carla, mãe de três filhos: João, 21 anos, que anda no 4º ano de Engenharia Electrotécnica da FEUP, Pedro, 20 anos, que está no 2º ano de Medicina (Porto) e Carolina, 11 anos, que estuda num colégio em Vizela

RESTAURANTE
Hippopotamus, Parque de Exposições de Villepinte

Pratos: Salada Caeser (com tomate cereja, frango e parmesão), chateaubriand com batata fritas e molho de mostarda Bebidas: Dois copos de cerveja 1664 e dois cafés

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