T27 Dezembro 2017
Dois cafés & a conta

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Incêndio
Albano não esquecerá nunca a ansiedade, dor e desespero que sentiu no trágico sábado, dia 17 de junho.
Albano Morgado
É único dos cinco netos de Albano Antunes Morgado que pegou no testemunho do avô.
Albano José Morgado

Para Albano Morgado, a prioridade do momento é por rapidamente no terreno o investimento de 1,5 milhões de euros numa nova e moderna tinturaria, que ele quer ver operacional o mais tardar dentro de um ano.

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or muitos anos que viva, Albano não esquecerá nunca a ansiedade, dor e desespero que sentiu – nem as terríveis imagens que viu no trágico sábado, dia 17 de junho.

O alerta chegou por volta das 20h00. O incêndio que deflagrara no concelho vizinho de Pedrógão Grande avançava perigosamente a grande velocidade, contou-lhe ao telefone o vigilante, Domingos Agria. Preocupado, pôs-se a caminho, mas às oito e um quarto daquele maldito dia, já não se conseguia chegar a Sarzedas de S.Pedro, a aldeia onde fica não só a fábrica da Albano Morgado mas onde mora também a mãe dele, Élia.

Desesperado e sem mais informações (o fogo cortara as comunicações), viveu as horas seguintes como se fossem longos e intermináveis dias. “Cheguei a pensar que tinha ardido tudo. E temi pela vida das minha mãe”, confessa.

Já passava das três da manhã, quando pôde ir a Sarzedas, atravessando a pé, com uma lanterna na mão, um cenário desolador e dantesco – uma escuridão de breu (quebrada aqui e ali por pequenos focos de fogos ), destroços, cadáveres carbonizados (que seria chamado a identificar), um silêncio de morte.

Preparado para o pior, teve duas alegrias, encontrou a mãe, com uma vela na mão e uma toalha molhada na cabeça, a preparar-se para se deitar. E na fábrica lá estava o vigilante Domingos, que esgotando o stock de extintores evitara que o fogo – que consumiu um armazém -, fizesse mais danos, e atingisse o depósito de nafta, abastecido na véspera.

O preço em vidas humanas foi pesado. O fogo levou a vida de três trabalhadores da Albano Morgado. No total, 11 pessoas morreram em Sarzedas. “12% da população da aldeia é muita gente”, conta Albano, que perdeu um cunhado bombeiro.

Na semana seguinte, sem electricidade e sem comunicações, a fábrica esteve fechada. Era a hora de chorar e enterrar os mortos. Depois foi a vez de olhar em frente – e cuidar dos vivos, das famílias dos 85 trabalhadores da Albano Morgado, o maior empregador de Castanheira de Pêra.

Cinco meses volvidos sobre a tragédia que enlutou as comemorações dos 90 anos da Albano Morgado, sentado à mesa do restaurante Paris, na vizinha Figueiró dos Vinhos, Albano falou com entusiasmo dos investimentos em curso – e recordou episódios curiosos da madrugada de 17 para 18 de junho.

“O incêndio já passou, não há luz, agora vou dormir”, respondeu-lhe pragmática a mãe, quando ele aliviado a encontrou viva e com saúde no quarto. “Se fizesse isso, em vez de morrer assado, morria cozido”, ripostou Domingos, o vigilante herói, quando Albano deu com ele na fábrica, cansado e preto negro como um carvoeiro, e comentou que se visse a coisa mal parada podia ter-se metido dentro do depósito com 20 mil litros de água.

O seguro está a tentar esquivar-se a pagar na totalidade os prejuízos provocado pelo incêndio, mas não é essa a principal preocupação de Albano. O que são 150 mil euros de prejuízo comparado com a perda de três companheiros de trabalho? A prioridade do momento é por rapidamente no terreno o investimento de 1,5 milhões de euros numa nova e moderna tinturaria, que ele quer ver operacional o mais tardar dentro de um ano.

Perfil

O apelo do chão da fábrica foi sempre superior ao dos livros e das salas de aula para o único dos cinco netos de Albano Antunes Morgado que pegou no testemunho do avô e dedica a sua vida profissional ao desenvolvimento da empresa de lanifícios fundada há 90 exatos anos pelo avô. Completado o 9º ano na Castanheira de Pera natal, fez o 12º ano em Coimbra (instalado em casa da tia Ema, uma solteirona) antes de rumar ao Porto, onde frequentou Gestão no ISAG. Chegado ao 3º ano, trocou o curso por um lugar na fábrica, a ajudar o pai (Isaltino) e o tio Aquiles a levarem a fábrica para a frente. “Nunca ia às aulas à 2ª feira, arranjava sempre um pretexto para ir à fábrica..”, conta Albano José, que é casado e tem dois filhos: uma rapariga de 19 anos, que estuda em Coimbra e quer ser advogada, e um rapaz de dez.

RESTAURANTE
Paris

Carameleiro

3260-308 Figueira dos Vinhos

 

Entradas: Queijo, enchidos e pataniscas de bacalhau Prato: Cozido à portuguesa Bebidas: Duas Quintas tinto, água e dois cafés

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