Eu sei que vocês sabem… mas eles parecem não saber
T55 - Julho/Agosto 220

Miguel Pedrosa Rodrigues

Vice-presidente da ATP
N

o dia 20 de Julho mês foi subscrita pela totalidade das associações do nosso sector – ANIL, ANIT-LAR, ANIVEC e ATP – uma carta endereçada ao Sr. Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital e à Sra. Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social onde a uma só voz fazem notar que sem o regresso da confiança dos consumidores internacionais e retoma do poder de compra nos mercados de destino, o sector não tem como ultrapassar o desafio que lhe é colocado pela pandemia. São também alertados os Srs. Ministros para uma projecção de perda de 30% das empresas do sector e mais de 40.000 postos de trabalho se nada de categórico for feito.

Os sintomas são reais: segundo os mais recentes dados estatísticos do INE, as contas divulgadas pela ATP para o período compreendido entre Janeiro e Maio de 2020 o comportamento das exportações foi o seguinte: Janeiro +2.7%; Fevereiro -2.3%; Março -18.9%; Abril -42.4% e Maio -32%… e não é difícil imaginar como será Junho e Julho. A retração global das exportações do sector no 1.º semestre ascende já aos 20% (dito em euros talvez tenha mais impacto: menos 420.000.000 de euros em apenas cinco meses).

É relevante mencionar também que os resultados do último inquérito às empresas relativo ao impacto da Covid-19 promovido pela ATP, de entre outras coisas, indica claramente o seguinte: um terço das empresas inquiridas indica em Junho reduções entre 30% e 50% e outro terço entre 10% e 30%. É prevista sensivelmente a mesma severidade em Julho. Quando estas mesmas empresas respondem à expectativa relativamente ao volume de negócios para o ano de 2020, verifica-se o mesmo padrão: um terço aponta para reduções compreendidas entre 30% e 50% e mais até de um terço entre 10% e 30%.

E é neste cenário que vamos chegar ao fim de Julho, ao fim da aplicabilidade da medida mais relevante que é o lay-off simplificado, e vamos entrar no apoio extraordinário à retoma progressiva que aponta agora a um lay-off mais complexo e mantém a premissa da quebra de vendas de 40% no mínimo. A cereja em cima do bolo foi a notícia no Jornal Público (27 de Julho): “O Estado vai pagar parte das horas trabalhadas em empresas que transitem do regime de lay-ff simplificado para o mecanismo que lhe vai suceder e que tenham quebras de facturação iguais ou superiores a 75%.”

E ao ler o artigo de imediato me veio à mente que as empresas do sector que estão há meses a suportar quedas consecutivas (recordo: -2,3% seguidos de -18,9%, seguidos de -42,4%, seguidos de -32% e assim consecutivamente) vão poder beneficiar deste apoio extraordinário se tiverem uma quebra de 75%, ou seja, quão morto morto tenho eu de estar neste país para me administrarem um Ben-u-ron?

O alheamento dos decisores políticos torna-se insuportável, a falta de entendimento sobre os reais indutores de sustentabilidade financeira das empresas é gritante e a continuar assim só nos resta esperar pelo pós-férias para ver se infelizmente temos razão ou não. É que convém lembrar – eu sei que vocês sabem… a questão é que eles parecem não saber – que no segundo semestre do ano, as empresas trabalham 5 meses e pagam 8.

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