Compreender o que é óbvio
T43 - Maio 19

Paulo Vaz

Diretor-Geral da ATP
e Editor do T
O

óbvio foi sempre o mais difícil de ser percebido.

O óbvio normalmente é mal compreendido pela classe política e pelos burocratas, pois o seu registo de vida faz-se noutro comprimento de onda, bastante desfasado da realidade e das preocupações dos simples mortais que nela habitam, e onde se incluem os empresários, os cidadãos em geral e todos os contribuintes, que acabamos fatalmente por ser.

Serve este intróito para falarmos do tema da competitividade e das indústrias transformadoras, como a ITV, que produzem bens transacionáveis, os quais, quando exportados, nos garantem uma balança comercial equilibrada e um país sustentável. Parece fácil de perceber para quem o quer, contudo nem sempre o que parece é.

Vejamos: há quatro fatores produtivos e um não-fator que definem a competitividade de uma empresa, de um sector ou de um país. A saber: o custo da mão-de-obra (que é diferente do salário), o custo da energia (que inclui tudo o que vem na fatura, seja energia ou não), o custo do dinheiro (e a dificuldade do acesso ao capital) e o custo ambiental, assim como o entorno amigo ou não dos negócios e do investimento, que se consubstancia simplesmente no peso da burocracia e da fiscalidade e na celeridade da justiça.

Em Portugal, se compararmos com os nossos principais concorrentes na Europa e os EUA, estamos quase sistematicamente em desvantagem: o custo da mão-de-obra, apesar de termos salários médios mais baixos, está fortemente penalizado pela fiscalidade (seja para o empregador como para o empregado), especialmente quando comparamos com os EUA; o custo da energia em Portugal é apenas um dos maiores da Europa, não tanto pela energia, mas pelos CMEC (custos de manutenção de equilibro contratual) que encontramos na fatura e que ultrapassam 50% do valor; o custo do dinheiro, que apesar de ter vindo a diminuir, por força do BCE e da melhoria do “rating” da República Portuguesa, ainda é proibitivo para a maioria das empresas, especialmente PMEs); e o custo ambiental, que se encontra bem exemplificado no recente diferendo que opõe as empresas aderentes ao SIDVA (Sistema Integrado de Despoluição do Vale do Ave) e a empresa concessionária, a TRATAVE, sobre o tarifário que lhe está aplicado e que, pela exorbitância dos valores e aumentos sucessivos, se apresenta como clara amostra do que se designa como “rendas excessivas”.

Finalmente, olhando todo o entorno, o contexto não podia ser mais negativo: além da hostilidade de certa classe política – dominante – que abomina a iniciativa privada e os empresários, por arreigada convicção ideológica, a verdade é que este sentimento está materializado num sistema judicial lento, que não conforta e não dá garantias a quem investe e a quem labora na observância da lei e do rigor, numa Administração Pública cada vez mais burocratizada e asfixiante, e numa fiscalidade que não cessa de ganhar peso, esmagando empresas e cidadãos.

Quando se invoca a reindustrialização e a necessidade de aumentar o peso das exportações no PIB do país, convém examinar lucidamente os obstáculos a estes generosos objetivos. Esses estão simplesmente no que atrás apontamos como condicionadores dos fatores produtivos. Aliviá-los ou suprimi-los é tornar o país mais competitivo dentro e mais concorrencial fora. Simplesmente isto. Óbvio?

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